sexta-feira, 21 de maio de 2010

RAZÕES PELAS QUAIS A CNBB PUBLICA O DOCUMENTO Nº 82

Fábio Coimbra

Diante do atual quadro político que parece contradizer os principais deveres e objetivos da política, a CNBB, numa tentativa de contribuir no processo de conscientização política da sociedade brasileira, lança o documento nº 82. Por meio deste, ela oferece subsídios que, de fato, possam guiar o povo no caminho do discernimento e conduzi-lo a uma boa escolha de seus candidatos.
Partindo do pressuposto de que o principal dever da política consiste na promoção da justa ordem do estado e da sociedade, conforme a encíclica Deus caritas est, escrito por Bento XVI, e tendo em mente a importância da participação popular ativa nas decisões políticas, fica obvio que o bem tão almejado para todos os cidadãos – independentemente do grau de escolaridade, raça, cor, sexo, idade, credo ou profissão – só se realiza mediante uma efetiva e rigorosa metodologia na forma de participação da vida política.
A corrupção generalizada, a escassa política agrária e as falhas na política de desenvolvimento e inclusão social além de outros fatos que resultam em problemas sociais instigam a igreja a tomar uma posição na luta pela justiça com o objetivo de sanar essas e outras doenças sociais.
Ao publicar esse documento, a CNBB busca tornar o povo consciente de que a sua participação na política se torna mais significante a partir do momento em que contribui para o desenvolvimento social. No documento, a CNBB expõe todo um método de trabalho pelo qual podemos conhecer melhor a política, como ela funciona e como exercer a cidadania, dentre outros aspectos.
Com isso a CNBB cumpre com um dos seus principais deveres, que é o de oferecer ao povo brasileiro suas contribuições especificas, isto é, oferecer elementos que lhe possa ser útil no processo de formação ética. O objetivo é propiciar-lhe um critério de discernimento cada vez mais formado e apto às exigências de transformação da realidade social.
A igreja em hipótese alguma entende tomar em suas mãos a batalha política, contudo, ela orienta e incentiva o povo a participar do processo democrático uma vez que este é parte do corpo social.
Uma segunda razão pela qual a igreja incentiva os cristãos a participarem efetivamente da atividade política é o seu grande sonho de ver a lei de Deus transparecer aqui na terra. Isso se realiza mediante o empenho, o esforço e a missão que cada um possui em favor do reino de Deus, em beneficio de todos.
A igreja luta para conduzir o povo à reflexão, de modo a entender que cada candidato possui uma extraordinária relevância no processo de desenvolvimento social. Esta realização só é possível uma vez que ele (candidato) é chamado a assumir com responsabilidade e comprometimento político os desafios do atual contexto. Estes desafios são, em sua totalidade, muito complexos.
É preciso ter experiência de vida pública e capacidade para lhe dar com eles sem se deixa vencer pelas alegorias e ilusões. Em outras palavras, é necessário que o candidato, que aspira pelo poder ou que luta para se conservar nele, tenha um pilar ético, uma espécie de base moral sobre a qual ele possa se firmar para enfrentar tais desafios. Caso não possua essa base, ele corre o risco de se fragmentar já na primeira onda de corrupção que vier de encontro à sua utópica estabilidade moral. A partir daqui, o individuo – agora já ingressado na decadência – passa a ser mais um, que não combate as injustiças sociais, mas que moralmente precisa ser combatido para não semear corrupção no terreno social.  
Deste momento em diante, esse individuo – que se corrompeu – passa a habitar em uma caverna cujo fechamento e escuridão são tão elevados que lhe propiciam apenas uma minúscula quantidade de luz confundindo ainda mais a sua cabeça. Ele não enxerga nada, está profundamente cego para o caminho da justiça e da virtude, da prudência, do desenvolvimento e de toda uma realidade social que lhe cerca.
A luz da justiça e da ética que se posicionam sobre a caverna projetando minúsculos raios de luz moral para dentro daquele lugar escuro, faz com que ele tome as imagens de corrupção que estão em sua cabeça como uma realidade eficaz para a sociedade. Em outras palavras, podemos dizer que ele toma o espectro, aquilo que é ilusório, pelo concreto e real. É preciso que haja mais luz para lhe iluminar o caminho da virtude.
Ele está doente e gravemente ferido. E quanto mais ele caminha na escuridão, mais se aprofunda em um mar de doença moral. É preciso que alguém lhe resgate da escuridão da caverna, e das correntes ideológicas que lá lhe aprisionam. Quando é libertado e posto para fora da caverna, isto é, devolvido para a sociedade, o individuo que outrora estava na escuridão – corrupção – não consegue ver com clareza a sociedade e seus desafios. Isto porque a luz da razão e da ética ainda lhe é muito escassa. O individuo, agora libertado, chora e entra em crise ao ser conscientizado moralmente e ver que a extensão da caverna na qual ele caminhava era complexa e enganadora.
Ele percebe que há uma grande distinção entre a realidade da caverna e a realidade fora dela. Uma vez libertado e reconscientizado, o individuo nota que existe uma grande diferença entre as ações de uma pessoa cuja vida se fundamenta na prática dos valores éticos à luz da razão e as ações de uma pessoa cujo modo de viver se baseia nos princípios das imoralidades à luz da ilusão, do espetáculo, e da corrupção.
Após passar por esse tipo de experiência, o individuo percebe que nem sempre as coisas funcionam conforme um modelo já estabelecido em mente, mas existe toda uma estrutura interna. Dessa forma, é preciso que se conheça com antecedência o caminho que se quer percorrer sempre numa perspectiva de se chegar a um determinado fim.
Isso pode eliminar a noção do perigo e das frustrações, tanto para si próprio, como para os outros – a sociedade – sobre os quais as conseqüências dos atos vão se dar.
Esta comparação com a alegoria da caverna serve para nos esclarecer melhor, assunto da nossa realidade política e social. A analogia também nos mostra como uma organização religiosa, como, por exemplo, a igreja católica, pode dar a sua contribuição no sentido de resgatar os valores democráticos e éticos da sociedade. Com base no que já foi dito, podemos, de certa forma, afirmar que a política, não é o principal, mas um dos assuntos que a igreja discute muito e, com o qual ela tem muitas preocupações. É por esta razão que a cada eleição que se aproxima, surge sempre uma nova preocupação por parte da igreja católica.
Essa preocupação sempre consiste em mostrar e esclarecer ao povo brasileiro a situação que se encontra o país e quais seus principais desafios. Partindo destas premissas, a igreja busca conduzir o povo à reflexão, pois esta pode tornar as ações humanas madura, comprometidas, conscientes e virtuosas.
A igreja, mediante o seu papel social, busca mostrar que a transformação de uma sociedade, em sua totalidade, só se realiza mediante uma participação cidadã no processo democrático. Isto significa dizer que somente o voto consciente é que tem o poder de transformar a sociedade. Eis, portanto, a razão do seu trabalho de conscientização. Dessa forma, a igreja incentiva os cristãos a participarem da ação democrática na vida social mediante reflexões e orientações. O objetivo é levar os fiéis a se engajarem com responsabilidade na ação política, acompanharem o mandato por meio de organizações e a conscientizar o restante do povo a respeito da importância de sua participação na vida política. Dentre outros objetivos, esses, talvez, são os que mais se destacam no projeto da igreja para o trabalho social.

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