O estado, em uma de suas concepções, é uma organização política e
administrativa de uma sociedade. A sociedade é composta por homens e mulheres.
Estes, por sua vez, se unem para formar família. As famílias se unem para organizarem
aldeias, grupos, bairros etc. Estes se ligam para formarem as cidades, estas,
mediante uma conjuntura superior a todos os seus antecedentes, constituem o
estado.
A origem do estado é longa e complexa. Por isso
não se pode entender o estado e a sua metodologia de funcionamento, sem antes se
ter uma visão geral, ainda que reduzida, do modo como ele emerge e se
estrutura.
Sem a existência de um povo, fica impossível a
existência de um estado. Pois este se radica no ato da existência humana.
Desta
forma é óbvio que, não obstante o estado instituído, o povo é soberano. Segundo
a constituição federal de 1988, art. 1º, parágrafo único “todo o poder emana do
povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente nos termos
da constituição” (cf. constituição
federal, art.1º, parágrafo único). A finalidade desse parágrafo é nos
mostrar que os representantes políticos de modo algum estão sobre o povo, pois
este é soberano e origem do poder.
Desse modo, os governantes não são outra coisa senão um instrumento por
meio do qual o povo exerce o seu poder. Sendo assim, podemos afirmar que o fato
de o povo designar pessoas para exercer seu poder e, portanto, lhe representar,
não significa dizer que ele tenha renunciado à sua força, ao seu direito e ao
seu poder, como afirmava o iluminista inglês Thomas Hobbes, em sua obra ”Leviathan“,
onde ele formula a tese de origem contratual do estado (cf. as Gerações de Direitos Humanos, primeira geração, os direitos
de liberdade).
Segundo Hobbes, depois do primitivismo caótico de convivência sem
ordem, os homens pactuaram renunciar a seus direitos naturais (segundo John Locke,
esses direitos seriam: a liberdade e a propriedade privada; esta última, mais
tarde, seria contestada por Rousseau, um dos principais pensadores iluministas)
objetivando a segurança de todos. Isto daria ao governante um poder absoluto.
Essa concepção de Hobbes de estado e de direito
do homem foi muito criticada no seu tempo e também hoje, pois é contraditório
colocar o homem em oposição àquilo que é inerente a si mesmo, o seu direito e
conseqüentemente a sua soberania. A tese de Hobbes sugere a existência de um
estado absolutista, algo que, do ponto de vista da formação de um estado
democrático, seria inconcebível uma vez que o estado se constitui em virtude da
soberania do povo. Isso garante ao povo o direito de participar afetivamente
das decisões do estado mediante a sua participação na vida e nas decisões
políticas.
No mesmo contexto de Hobbes, está John Locke.
Famoso pensador inglês e também iluminista, é fundador do empirismo e autor da
teoria da liberdade natural do ser humano. Segundo Locke, os homens optaram se constituir
em sociedade no afã de alcançarem melhor proteção de seus direitos naturais (cf. As gerações de direitos humanos,
primeira geração). Por essa razão, ele diverge do seu contemporâneo Thomas
Hobbes.
A concepção de estado, de Locke, se distancia
de um estado absolutista e se aproxima, em parte, de um modelo de estado
democrático, pois prevê a participação popular. Segundo Locke, o fato de os
homens se unirem em sociedade não implica renúncia de diretos, mas uma busca de
proteção para os mesmos. Isso só é possível mediante uma aliança ou uma
confiança que se constitui entre uma autoridade e o povo, que confia seus direitos
à autoridade mediante um contrato (cf.As
Gerações de Direitos Humanos, primeira geração).
Isso garante ao povo o direito de participar e
exigir dos seus representantes melhor qualidade no funcionamento e organização social,
tendo em vista a promoção do bem comum e a prática dos interesses da
coletividade (princípio de democracia). Nesse contexto, surge Jean-Jacques Rousseau,
que em sua obra “Do Contrato Social” expôs a tese de que os homens se uniram
por motivos eminentemente pragmáticos na soma de forças para sobrepujar a
resistência. Essa união era realizada por meio do contrato social a se
constituir em um instrumento que garantia simultaneamente a igualdade e a liberdade
(cf. As Gerações de Direitos Humanos,
primeira geração). Nesse aspecto como podemos notar, Rousseau diverge
de seu contemporâneo Locke que associava liberdade e propriedade. Segundo Rousseau,
a propriedade era a causa primeira e o fundamento da miséria social.
Diante de tudo o que já foi dito sobre o
estado, desde a sua formação até a sua concepção por parte de muitos pensadores
que, mediante seu raciocínio, mudaram a forma de pensar o estado na idade contemporânea,
trataremos agora de um outro estado, que não é mais um estado naturalista ou um
estado da propriedade privada, mas um estado denominado providência.
Partindo do pressuposto de que o estado é a
forma de exercer o poder provindo do povo, o estado providência, por sua vez,
tem a função de garantir os direitos sociais, numa perspectiva de educação,
saúde, trabalho, previdência e assistência social.
O estado providência tem como modelo os
direitos sociais, ou seja, ele parte desses direitos, sempre com o objetivo de realizar
o bem comum e contribuir para que todos os cidadãos estejam providos em suas
necessidades básicas. Um outro aspecto muito importante é que o sucesso da realização
do estado providencia radica-se na rigorosa metodologia de cumprimento e
prática dos direitos sociais, enquanto caminho de justiça social.
O estado providencia é fruto de um pacto social
entre capital-estado-classe trabalhadora. Esse estado trata de promover o bem e
o convívio social para poder garantir ao povo uma vida menos indigna de seus
valores.
É fundamental que o estado, para uma eficaz realização
dos direitos sociais, busque manter relações com instituições financeiras numa
tentativa de obter não só o capital necessário à realização do seu dever, mas o
apóio no processo de democratização dos direitos sociais.
Cabe ressaltar que, no estado providencia, a
consolidação da seguridade social realiza-se mediante um pacto entre forças
sociais que detêm expressivo poder.
Segundo a constituição federal, art. 194: “a
seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos
poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde,
à previdência social e à assistência social”. Portanto, a seguridade social não
é apenas uma mera aliança, mas um pacto que envolve um grande compromisso e o
controle desse compromisso pelas forças que o firmam. Esse pacto surge em
virtude da defesa do estado nação numa perspectiva de instituir, estabilizar e
garantir a identidade da nação. Dessa forma, o pacto é amplo e envolve toda a
nacionalidade.
Por essa razão, a seguridade social do estado
providencia deve ter em seus financiamentos a participação de toda a sociedade.
Conforme o art. 195 da constituição federal, “a
seguridade social será financiada por toda a sociedade de forma direta ou
indireta, nos termos da lei, mediante recursos provindos dos orçamentos da
união, dos estados, do distrito federal e dos municípios, além de outras
contribuições sociais. Portanto, a seguridade social também é democrática, pois
envolve a participação do povo, ainda que indiretamente”.
A virtude do estado providencia seria, portanto,
a eficiência na capacidade de produzir uma melhora das condições materiais de
vida da classe trabalhadora, e não somente desta, mas de toda a sociedade.
De acordo com a constituição federal, são três
os direitos relativos a serem assegurados: saúde; previdência social e assistência
social.
A saúde é direito de todos e dever do estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco
de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para sua promoção, proteção e recuperação (c.f. Constituição federal, 1988, titulo VIII – da ordem social, cap.
II – da seguridade social, seção II – da saúde, art. 196).
A previdência social será organizada sob a
forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória,
observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial (cf. Constituição federal, 1988, titulo VIII,
cap. II, seção III – da previdência social, art. 201).
A assistência social será prestada a quem dela
necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social (cf. constituição federal, art.203).
O estado providencia, portanto, não se
assemelha a um modelo de estado absolutista, nem implica em renúncia de
direitos conforme a concepção do iluminista Thomas Hobbes, tampouco se prende à
propriedade privada conforme a teoria de John Locke, mas é um estado que se
fundamenta nos princípios de igualdade e de liberdade do seu povo conforme a
teoria de Jean-Jacques Rousseau, que vê o povo como único soberano (cf. As Gerações de Direitos Humanos,
primeira geração).
O estado providencia se pauta no seu
compromisso para com o povo e na contribuição do povo para com o seu
compromisso. Portanto, é um verdadeiro paradigma de estado sociável, que se realiza
por meio da participação popular. Dessa forma a origem do estado providência fundamenta-se
em princípios democráticos.
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