domingo, 10 de julho de 2011

RESUMO PARCIAL DO LIVRO QUATRO DA OBRA DO "DO SUMO BEM E DO SUMO MAL" DE CÍCERO




Do sumo bem e do sumo mal (De finibus bonorum Et malorum), é uma obra escrita por Marco Túlio Cícero, natural de Arpino cuja vida se estendeu do ano 106 a.C. até por volta de 43 a.C.[1] Não sendo, portanto,um cidadão romano, propriamente dito, nem por isso ele deixa de ter seu mérito por ter lutado para melhorar aquele Estado. Tendo conhecido bem a cultura grega, e sabendo da importância dela, eis, portanto, um dos objetivos de Cícero:

[...] transplantar a cultura grega para o então solo rústico da sua pátria, a fim de dar-lhe uma orientação ética geral e solidificar, sobre os alicerces perenes da lei natural, esta polis que progressivamente se confundia com quase todo o orbe conhecido. [2]

Sendo esse um dos seus objetivos, ou sua preocupação fundamental, Cícero julga ser necessário que algumas mudanças sejam feitas no ato de transplantá-la [a cultura grega para a sua pátria]. Em princípio, ele se contrapõe a concepção vigente do seu tempo de que para ser erudito era preciso saber grego. Daí a razão pela qual ele, combatendo essa idéia, procura, no capítulo segundo do primeiro livro da obra supracitada fazer uma exaltação da língua latina, mostrando a sua riqueza e a sua grandeza. Isso fica bem mais claro no terceiro capítulo do mesmo livro quando ele diz “[...] creio e muitas vezes defendi que a língua latina não só não é pobre, como a considera o vulgo, senão que é mais rica que a grega.” [3] O esforço empreendido por ele nesse sentido consiste em “tornar douto os seus concidadão”, cujo eloqüente saber deve se dar por meio de um bom uso das letras ou da língua, independente desta ser grega ou latina. Embora de considerável relevância para o entendimento do pensamento de Cícero, é preciso admitir que essas questões são apenas questões preliminares em relação ao problema que ele realmente suscita em Do sumo bem e do sumo mal.
Para tentar entender o assunto com mais perspicácia, e já ir, portanto, direto ao problema, se torna fundamental questionar: mas a final, o que vem a ser para Cícero o sumo bem? E o vem a ser, por sua vez, sumo mal? O que significa viver bem? O que significa viver mal? Uma vez respondidas, essas questões se tornam relevantes não somente por situar-nos no cerne do problema ciceroniano, mas, sobretudo, por promover certo entendimento a cerca do assunto tratado.
O estilo de vida do grego como é sabido, era muito diferente do estilo de vida do romano. Enquanto na Grécia a vida estava liga a certas questões especificas, como, por exemplo, a metafísica, a contemplação dentre outras teorias, em Roma, à sua vez, a vida era marcada pela práxis, a ação concreta dos homens daquela época. Em alguns sentidos e certos contextos, portanto, é possível dizer que teoria e práxis são o que permite distinguir Roma e Grécia antigas. Significa isto que os romanos eram mais pragmáticos que os gregos. Sendo assim, não dava para Cícero transpor a cultura grega para Roma considerando todos os seus atributos e qualidade. Pois, a vida era diferente nessas duas culturas. Entretanto, há coisa que ele mantém, ou seja, há coisa que ele comunga com os gregos.
Na filosofia grega antiga, uma noção de ordem está presente, sobretudo, a partir dos pré-socráticos, que foram os iniciadores da filosofia, a exemplo de Tales de Mileto que é considerado o primeiro filósofo grego. Essa noção de ordem que os pré-socráticos tinham era derivada puramente da natureza, com a qual estavam em constante contato. Foi para o estudo da natureza, numa tentativa de compreendê-la que os pré-socráticos voltaram sua atenção. O que eles queriam mesmo era encontrar nela um principio primeiro que como tal fosse causa de todas as outras coisas. Em outras palavras, isso significa dizer que eles buscavam encontrar uma lei, ou as leis que regem a natureza, ou o universo da qual se teria, então, a noção de ordem. Assim é que um diz que o principio de tudo é a água, outro que é o fogo, outro que é o apeiron, outro que é o ar e assim por diante. Essa noção de ordem que se faz presente na natureza e que os gregos tentaram encontrar fora, evidentemente, um dos aspectos da filosofia, ou da cultura grega que Cícero conservara ao transportá-la para Roma.
Os conceitos de “natureza”, “ordem” e “lei” são conceitos chaves à compreensão da problemática que ele suscita em Do sumo bem e do sumo mal, e que também contribuem relevantemente para responder aos questionamentos acima levantados, que não são outra coisa senão desdobramento do problema proposto por Cícero. Cumpre aqui ressaltar que a concepção tanto de lei e natureza estão estritamente atreladas à metafísica grega. É de suma importância ressaltar que alem dos conceito acima citados, outros também são fundamentais no contexto do pensamento ciceroniano, tais como o de “felicidade” e “virtude”. Para dar conta do seu problema, Cícero trava diretamente um duelo com os epicuristas aos quais vai tecer duras criticas, sobretudo, em se tratando do prazer. Na concepção de Cícero a filosofia epicurista é uma filosofia voltada para o prazer e deixa de lado as virtudes, sendo estas as que mais interessam a Cícero.  
Ao longo de Do sumo bem e do sumo mal Cícero esclarece melhor o que entende por virtude, natureza, ordem, vida virtuosa e lei dentre outras. No “livro quatro”, por exemplo no capitulo II ele vai falar a tripartição da filosofia feita pelos discípulos de Platão, entre os quais se destaca Aristóteles e Xenócrates. Essa divisão, segundo ele, foi conservada também por Zenão. [4]
Embora não diga diretamente, mas nas entrelinhas, cabe aqui dizer que essa tripartição consistiu na organização da filosofia em três ramos, a saber, a lógica, a física e a ética. Também nesse capítulo, ele introduz a idéia da sociabilidade natural, o que vai ser, posteriormente, na modernidade, combatida por autores como Thomas Hobbes. No capitulo IV ele vai, então discorrer sobre a lógica na medida em que trata da dialética do discurso. Nesse sentido, ele mostra a importância da lógica para uma boa argumentação. No capítulo V ele começa a tratar da natureza, ou seja, da física, e apresenta a razão como sendo a “verdade e suprema lei”. No capitulo VI ele entra diretamente ao problema na medida em que começa a tratar do sumo bem. Diz ele

Os filósofos anteriores, e com mais clareza que nenhum Pólemon, tinham dito que o sumo bem consiste em viver conforme a natureza, mas os estóicos acrescentam que estas palavras significam três coisa: a primeira consiste em viver ordenadamente e com ciência as coisas que naturalmente sucedem [...]. A segunda que significam estas palavras é viver observando todos os deveres ou a maior pare delas. [...] A terceira consiste em viver desfrutando de todas ou da maior parte das coisas que são conforme a natureza. [5]

 
Isso que ele está dizendo a cerca dos filósofos anteriores se resume em quatro palavras: natureza, ordem, dever e felicidade. Sobre a perfeição, ainda nesse capítulo, percebe-se que ela decorre da virtude e que esta, à sua vez decorre da natureza na medida em que viver virtuosamente é viver de acordo com a natureza.
No capítulo VII ele trata do “amor-de-si” e do principio da causalidade. Quanto a causalidade ele diz que “há um mor de ciência inato na alma, ao qual se segue a avidez de investigar as razões.” [6] Ou seja, é o amor, ou desejo natural de conhecer que leva o homem procurar a causa e daí o princípio de causalidade. No capítulo IX Cícero combate a tese da semelhança entre as coisas. No capitulo X ele discorre sobre o que seria o sumo bem para os antigo. Segundo ele, viver bem para os antigos era viver conforme a natureza. No capitulo XI apresenta a idéia de que o sumo bem é a honestidade da vida e a honestidade da vida consiste em viver de acordo com a natureza. No capítulo XII ele fala dos deleites. Quanto aos deleites, vê-se que há uns que são grandes e outros que são pequenos. A tendência dos pequenos é desaparecer frente aos grandes, da mesma forma como a luz de uma lanterna nada significa ao dia na presença da luz do sol, mas o que importa é que mesmo sendo pequeno eles são parte da vida.  



[1] Cf. data em: CÍCERO, Marco Túlio. Do sumo bem e do sumo mal. Trad. Carlos Ancêde Nougué. São Paulo: Martins Fontes, 2005. (nota de apresentação, p. IX).
[2] Idem, p. X.
[3] Idem p. 5
[4] Cf. idem, p. 122-123.
[5] Idem, p. 127
[6] Idem, p. 129.

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