sexta-feira, 1 de abril de 2011

FICHAMENTO DO CAP. XIII DO LEVIATÃ




SOBRE A CONDIÇÃO NATURAL DA HUMANIDADE RELATIVAMENTE À SUA FELICIDADE E MISÉRIA 

Os homens iguais por natureza – Da igualdade deriva a desconfiança – Da desconfiança, a guerra – Fora dos Estados civis, há sempre guerra de todos contra todos – Os inconvenientes de uma tal guerra – Numa tal guerra, nada é injusto – As paixões que levam os homens a tender para a paz

- Observa-se que a natureza fez os homens tão iguais, no que se refere às faculdades do corpo e do espírito que, embora por vezes se encontre um homem visivelmente mais forte de corpo, ou de espírito mais vivo do que outro, quando se considera tudo isso em conjunto, a diferença entre um e outro homem não é suficientemente considerável para que outro não possa com razão nela reclamar qualquer benefício a que outro não possa também aspirar, tal como ele. (p. 96).
- Quanto à força corporal, o mais fraco tem força suficiente para matar o mais forte, quer por secreta maquinação, quer aliando-se com outros que se encontrem ameaçados pelo mesmo perigo. (p. 96).
- No que se refere às faculdades do espírito [...], encontro entre os homens uma igualdade ainda maior que a igualdade de força. (p. 96).
- A prudência nada mais é do que experiência, que um tempo igual oferece a todos os homens equitativamente, naquelas coisas a que igualmente se dedicam. (p. 96).
- O que aparentemente possa tornar inaceitável essa igualdade é simplesmente a concepção vaidosa da própria sabedoria, a qual quase todos os homens supõem possuir em maior grau que o vulgo. (p. 96).
- A natureza dos homens é tal que, embora sejam capazes de reconhecer em muitos outros maior inteligência, maior eloqüência ou maior saber, dificilmente acreditam que haja muitos tão sábios como eles próprios. (p. 96).
- Em geral não há sinal mais claro de uma distribuição equitativa de alguma coisa do que o fato de todos estarem contentes com a parte que lhes coube. Desta igualdade quanto a capacidade deriva a igualdade quanto à esperança de atingirmos nossos fins. (p. 96).
- Se dois homens desejam a mesma coisa, portanto, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por ambos, eles se tornam inimigos. No caminho para seu fim que – que é principalmente sua própria conservação e às vezes apenas seu deleite –, esforçam-se por destruir ou subjugar um ao outro. (p. 96-97).
- Contra esta desconfiança de uns em relação aos outros, nenhuma maneira de se garantir é tão razoável como a antecipação. (p. 97).
- Esse aumento de domínio sobre os homens, sendo necessário para a conservação de cada um, deve ser por todos, admitido, obviamente. (p. 97).
- [...] os homens não tiram prazer algum da companhia uns dos outros – e sim desprazer –, quando não existe um poder capaz de manter a todos em respeito, pois cada um pretende que seu companheiro lhe atribua o mesmo valor que ele se atribui a si próprio, e na presença de todos os sinais de desprezo ou de subestimação, naturalmente se esforça, na medida em que a tal se atreva [...], por arrancar de seus contendores a atribuição de maior valor, causando-lhes dano e, pelo exemplo, expandindo o dano aos demais. (p. 97).
- Na natureza do homem encontramos três causas principais de discórdia. Primeiro, a competição; segundo, desconfiança; e terceiro, a vanglória. (p. 97).
- A primeira leva os homens a atacar os outros visando lucro. A segunda, a segurança. A terceira, a reputação.  Os primeiros praticam a violência para se tornar senhores das pessoas, mulheres, filhos e rebanhos dos domínios. Os segundos, para defendê-los. Os terceiros por ninharias, como uma palavra, um sorriso, uma diferença de opinião e qualquer outro sinal de desprezo, quer seja diretamente endereçado a sua pessoa, quer indiretamente a seus parentes, amigos, nação, profissão ou seu nome. (p. 97-98).
- [...] durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se encontram naquela situação a que se chama guerra. Uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens. A guerra não consiste apenas na batalha, ou no ato de lutar, mas naquele lapso de tempo durante o qual a vontade de travar batalha é suficientemente conhecida. Daí a noção de tempo deve ser levada em conta quanto a natureza da guerra, do mesmo modo que quanto a natureza do clima. Tal como a natureza do mal tempo não consiste em dois ou três chuviscos, mas numa tendência para chover que pode durar vários dias seguidos, também a natureza da guerra não consiste na luta real, mas na conhecida disposição para tal [...]. (p. 98).
- Os desejos e outras paixões dos homens não são em si mesmos um pecado. Nem tampouco o são as ações que derivam dessas paixões, até o momento em que se tome conhecimento de uma lei que as proíba, o que será impossível até o momento em que sejam feitas as leis. Nenhuma lei pode ser feita antes de se determinar qual pessoa irá fazê-la. (p. 99).
- Da guerra de todos contra todos, também isto é consequencia: que nada poder ser injusto. As noções do bem e do mal, de justiça e injustiça, não podem ter lugar ai. Onde não há poder comum não há lei. Onde não há lei não há injustiça. Na guerra, a força e a fraude são as duas virtudes principais. A justiça e a injustiça não fazem parte das faculdades do corpo ou do espírito. [...]. São qualidades que pertencem aos homens em sociedade, não na solidão. Outra consequência da mesma condição é que não há propriedade, domínio, distinção entre o meu e o teu. Pertence a cada um só aquilo que ele é capaz de conseguir, e apenas enquanto for capaz de conservá-lo. É esta a miserável condição em que o homem realmente se encontra, por obra da simples natureza. (p. 99-100).
- As paixões que levam os homens preferir a paz são o medo da morte, o desejo daquelas coisas que são necessárias para uma vida confortável e a esperança de consegui-las por meio do trabalho. (p. 100).
- A razão sugere adequadas normas de paz, em torno das quais os homens podem chegar a acordos. Essas normas são aquelas a que por outro turno se chama leis da natureza. (p. 100).

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