sexta-feira, 1 de abril de 2011

FICHAMENTO DO CAP. XI DO LEVIATÃ




SOBRE AS DIFERENÇAS DE COSTUMES

O que aqui se entende por costumes – Um irrequieto desejo de poder, em todos os homens – O gosto pela disputa derivado do gosto pela competição – A obediência civil derivada do gosto pelo conforto – Derivada do medo da morte ou dos ferimentos – E do amor às artes – O amor à virtude derivado do amor à lisonja – O ódio derivado da dificuldade de obter grandes benefícios – E da consciência de merecer ser odiado – A tendência para ferir derivada do medo – E da desconfiança no próprio talento – Os empreendimentos vãos derivados da vanglória – A ambição derivada da opinião de suficiência – A irresolução derivada do exagero da importância das pequenas coisas – A confiança nos outros derivada da ignorância dos sinais da sabedoria e da bondade – E da ignorância das causas naturais – E da falta de entendimento – A aceitação dos costumes derivada da ignorância da natureza do bem e do mal – A aceitação dos indivíduos derivada da ignorância das causas da paz – A credulidade derivada da ignorância da natureza – A curiosidade de saber derivada da preocupação com o tempo futuro – Sua religião natural.

- [...] a felicidade desta vida não consiste no repouso de um espírito satisfeito. (p. 78).
- Ao homem é impossível viver quando seu desejo chega ao fim, tal como quando seus sentidos e imaginação ficam paralisados. (p. 78).
- A felicidade é um contínuo progresso do desejo, de um objeto para outro, não sendo a obtenção do primeiro outra coisa senão o caminho para conseguir o segundo. Sendo a causa disso que o objeto do desejo do homem não é gozar apenas uma vez, e só por um momento, mas garantir para sempre os caminhos de seu desejo futuro. (p. 78).
- [...] assinalo como tendência geral de todos os homens um perpétuo e irrequieto desejo de poder e mais poder, que cessa apenas com a morte. A causa disso nem sempre é que se espere um prazer mais intenso do que aquele que já se alcançou [...] mas o fato de não se poder garantir o poder e os meios para viver bem. Daqui se segue que os reis, cujo poder é maior, se esforçam por garanti-lo no interior por intermédio de leis, e no exterior por meio de guerras. (p. 78).
- A disputa pela riqueza, a honra, o mando e outros poderes leva à luta, à inimizade e à guerra, porque o caminho seguido pelo competidor para realizar seu desejo consiste em matar, subjugar, suplantar ou repelir o outro. (p. 78-79).
- Deleite sensual e desejo de conforto predispõem os homens para a obediência ao poder comum, pois com tais desejos se abandona a proteção que se poderia esperar do esforço e trabalho próprios. O medo da morte e dos ferimentos produz a mesma tendência e pela mesma razão. (p. 79).
- [...] os homens necessitados e esforçados, que não estão contentes com sua presente condição, [...] têm tendência para provocar situações belicosa e para causar perturbações e revoltas. (p.79)
- [...] tudo o que constitui prazer para os sentidos constitui também para a imaginação. (p. 79).
- Faz tender para o amor fingido receber de alguém a quem consideramos nosso igual maiores benefícios do que esperávamos. Na realidade, faz tender para o ódio secreto, pois nos coloca na situação de devedor desesperado que, ao recusar-se ao ver seu credor, tacitamente deseja que ele se encontre onde jamais possa voltar a vê-lo. Os benefícios obrigam, e a obrigação é servidão. (p. 79).
- A obrigação que não se pode compensar é servidão perpétua. (p. 79).
- Nos tumultos e sedições, os homens que desconfiam de sua própria sutileza se encontram mais predispostos para a vitória do que os que se consideram sábios ou sagazes, pois estes últimos gostam de se informar primeiro e os outros com medo de ser ultrapassados gostam de atacar primeiro. (p. 80).
- Os homens vaidosos, que sem ter consciência de grande capacidade se deliciam em julgar-se valentes, tendem apenas para a ostentação, não para os atos, pois quando surgem perigos ou dificuldades só os aflige ver descoberta sua incapacidade. (p. 80).
- Os homens que têm em alta sua sabedoria em questões de governo têm tendência para a ambição. (p. 80).
- Embora nos pobres seja uma virtude, a frugalidade torna os homens incapazes de levar a cabo as ações que necessitam da força de muitos homens ao mesmo tempo. Pois enfraquece seu esforço, que deve ser alimentado e revigorado pela recompensa. (p. 81).
- A ausência de ciência, em outras palavras, a ignorância das causas, predispõe, ou melhor, obriga os homens a confiar na opinião e autoridade alheia. Todos os homens preocupados com a verdade, se não confiarem em sua própria opinião, deverão confiar na de alguma outra pessoa, a quem considerarem mais sabia que eles próprios, e não considerem provável que queira enganá-los. (p. 81).
- O desconhecimento do significado das palavras, isto é, a falta de entendimento, predispõe os homens para confiar, não apenas na verdade que não conhecem, mas também nos erros e, mais importante, nos absurdos daqueles em quem confiam. Nem o erro nem o absurdo podem ser detectados sem um perfeito entendimento das palavras. (p. 81).
- [...] em todos os lugares onde os homens se vêem sobrecarregados com tributos fiscais, descarregam sua fúria em cima dos publicanos, quer dizer, os recebedores fiscais e outros funcionários da renda pública, e se associam àqueles que censuram o governo civil. (p. 82-83).
- [...] a ignorância das causas naturais predispõe os homens para a credulidade, fazendo-os inúmeras vezes acreditar em coisas impossíveis. [...] a credulidade predispõe-nos para mentir. [...] a simples ignorância sem ser acompanhada de malícia é capaz de levar os homens tanto para acreditar em mentiras como a dizê-las. A inventá-las também. (p. 83).
- O que predispõe os homens para investigar as causas das coisas é a ansiedade em relação ao futuro, já que esse conhecimento torna os homens mais capazes de dispor o presente da maneira mais vantajosa. (p. 83).
- O amor pelo conhecimento das causas [...] afasta o homem da contemplação do efeito para a busca da causa, e depois também da causa dessa causa, até que forcosamente se deva chegar a essa idéia: de que há uma causa da qual não há causa anterior, porque é eterna. É aquilo a que os homens chama Deus. De modo que é impossível proceder a qualquer investigação profunda das causas naturais, sem com isso nos inclinar para acreditar que existe um Deus eterno, embora não possamos ter em nosso espírito uma idéia dele que corresponda à sua natureza. (p. 83).
- [...] por meio das coisas visíveis deste mundo, e de sua ordem admirável, se pode conceber que há uma causa dessas coisas, a que os homens chamam Deus, mas sem ter uma imagem ou idéia dele no espírito. (p. 83).
- Aqueles que pouca ou nenhuma investigação fazem das causas naturais das coisas [...] tendem a supor e a imaginar por eles mesmos várias espécies de poderes invisíveis, e a se encher de admiração e respeito por suas próprias fantasias. Em épocas de desgraça tendem a invocá-las. Quando esperam um bom sucesso tendem a agradecer-lhes, transformando em seus deuses as criaturas de sua própria fantasia. Foi dessa maneira que aconteceu, devido a infinita variedade de fantasias, terem os homens criados no mundo inúmeras espécies de deuses. Esse medo das coisas invisíveis é a semente natural daquilo a que se chama religião. Esse medo, naqueles que veneram e temem esse poder de maneira diferente da sua, se chama superstição. (p. 83-84).

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