quinta-feira, 19 de maio de 2011

FICHAMENTO DO CAP. XX DO LEVIATÃ




SOBRE O DOMINO PATERNO E DESPÓTICO


O Estado por aquisição – Em que difere do Estado por instituição – Os direitos da soberania são em ambos os mesmo – Como se chega ao domínio paterno – Não por geração, mas por contrato; ou educação; ou anterior sujeição de um dos pais ao outro – O direito de sucessão segue-se das regras da posse – Como se chega ao domínio despótico – Não pela vitória, mas pelo consentimento dos vencidos – Diferença entre uma família e um reino – O direito da monarquia tirados das escrituras – Em todos os Estados o poder soberano deve ser absoluto

- Estado por aquisição é aquele em que o poder soberano foi adquirido pela força. É adquirido pela força quando os homens individualmente ou em grande número e por pluralidade de votos, por medo da morte ou do cativeiro, autorizam todas as ações daquele homem ou assembléia que tem em seu poder suas vidas e sua liberdade. (p. 150).
- Esta espécie de domínio ou soberania difere da soberania por instituição em apenas um aspecto: os homens que escolhem seu soberano fazem-no por medo uns dos outros e não daqueles a quem escolhem. Nesse caso submetem-se aquele de quem tem medo. Fazem-no por medo em ambos os casos, o que deve ser notado por todos aqueles que consideram nulos os pactos conseguidos pelo medo da morte ou da violência. (p. 150).
- Num Estado já instituído, ou adquirido, [...] as promessas derivadas do medo da morte e da violência não são pactos nem geram obrigação, quando a coisa prometida é contrária a lei. (p. 150).
- [...] quando alguém pode legitimamente cumprir uma promessa e não o faz, não é a invalidez do pacto que o absorve e, sim, a sentença do soberano. (p. 150).
- [...] tudo aquilo que alguém legitimamente prometesse seria ilegítimo não cumprir. (p. 150).
- Quando o soberano, no entanto, como ator, o dispensa, ele está sendo dispensado por aquele que extorquiu a promessa, na qualidade de autor dessa absolvição. (p. 150).
- Os direitos e consequências da soberania são os mesmos em ambos os casos. (p. 150).
- Seu poder [soberano] não pode sem seu consentimento ser transferido. (p. 150-151).
- É juiz [soberano] do que é necessário para a paz e juiz das doutrinas. É o único legislador e supremo juiz das controvérsias, assim como dos tempos e ocasiões da guerra e da paz; é a ele quem compete a escolha dos magistrados, conselheiros, comandantes, assim como todos os outros funcionários e ministros. É ele quem determina as recompensas e castigos, as honras e as ordens. (p.151).
- De duas maneiras pode ser adquirido o domínio: por geração e por conquista. O direito de domínio de geração é aquele que os pais têm sobre sues filhos. Chama-se paterno. Esse direito não deriva da geração, como se os pais tivessem domínio sobre seu filho por tê-lo procriado e, sim, do consentimento do filho, seja expressamente ou por outros argumentos suficientes declarados. (p. 151).
- O filho deveria estar igualmente submetido a ambos [pai e mãe], o que é impossível, pois ninguém pode obedecer a dois senhores. Aqueles que atribuem o domínio apenas ao homem [...] engana-se totalmente. Nem sempre se verifica essa diferença de força e prudência entre o homem e a mulher [...]. (p.151).
- Nos Estados, essa controvérsia é decidida pela lei civil, e na maior parte dos casos, embora nem sempre, a sentença é favorável ao pai. Isso porque na maior parte dos casos o Estado foi criado pelos pais, não pelas mães de famílias. (p. 151).
- Não havendo contrato, o domínio pertence à mãe. Na condição de simples natureza, onde não existem leis matrimonias, é impossível saber quem é o pai, a não ser que tal seja declarado pela mãe. O direito de domínio sobre os filhos, portanto, depende da vontade dela, e consequentemente pertence-lhe. (p. 152).
- [...] sendo a preservação da vida o fim em vista do qual um homem fica sujeito a outro, supõe-se que todo homem prometa obediência àquele que tem o poder de salvá-lo ou de destruí-lo. (p. 152).
- Caso a mãe se encontre submetida ao pai, o filho se encontra em poder do pai. Se o pai estiver submetido à mãe – com quando uma rainha soberana desposa um de seus súditos –, o filho fica submetido à mãe, visto que o pai também a ela está submetido. (p. 152).
- O soberano de cada pais tem direito de domínio sobre todos os que lá residem. (p. 152).
- Aquele que tem domínio sobre a pessoa de alguém também tem domínio sobre tudo quanto lhe pertence, sem o que o domínio seria apenas m título desprovido de quaisquer efeitos. (p. 152).
- Passe-se o mesmo com o direito de sucessão ao domínio paterno e com o direito de sucessão à monarquia [...]. (p. 152).
- Domínio adquirido por conquista ou vitória militar é aquele que alguns autores chamam despótico, de despótes, que significa senhor ou amo, e é o domínio do senhor sobre seu servo. O domínio é adquirido pelo vencedor quando o vencido, para evitar o iminente golpe de morte, promete [...] que enquanto sua vida e liberdade de seu corpo lho permitirem, o vencedor terá direito a seu uso, a seu bel-prazer. Após realizado esse pacto, o vencido torna-se cervo, mas não antes. (p. 152-153).
- Pela palavra servo [...] não se entendem um cativo, que é guardado na prisão ou a ferro, até que o proprietário daquele que o tomou ou o comprou de alguém que o fez, decida o que vai fazer com ele. (p. 153).
- Por servo, entende-se alguém a quem se permite a liberdade corpórea e que, após prometer não fugir nem praticar violência contra seu senhor, recebe a confiança deste ultimo. (p. 153).
- Não é a vitória que confere o direito de domínio sobre o vencido, mas o pacto celebrado por este. Ele não adquire a obrigação por ter sido conquistado [...] mas por ter aparecido e ter-se submetido ao vencedor. O vencedor não é obrigado, pela rendição do inimigo [...], a poupá-lo, por ter-se entregue a sua disposição. O vencedor só é obrigado na medida em que em seu próprio discernimento, considerar bom. (p. 153).
- Sua vida só se encontra em segurança e sua servidão só se torna uma obrigação, depois de o vencedor lhe ter outorgado sua liberdade corpórea. (p.153).
- Os escravos que trabalham nas prisões ou amarrados por cadeias não o fazem por dever, mas para evitar a crueldade de seus guardas. (p.153).
- O senhor do servo é também senhor de tudo quanto este tem e pode exigir seu uso. (p. 153).
- [...] os direitos e consequências tanto do domínio paterno quanto do domínio despótico são exatamente os mesmos que os do soberano por instituição e pelas mesmas razões [...]. (p. 153-154).
- [...] uma grande família, se não fizer parte de nenhum Estado, é em si mesma, quanto aos direitos de soberania, uma pequena monarquia. [...]. Alem disso uma família não é propriamente um Estado, a não ser que graças a seu numero, ou a outras circunstancias, tenha poder suficiente para só ser subjugada pelos azares da guerra. (p. 154).
- Quando certo numero de pessoas reconhecidamente é demasiado fraco para se defender em conjunto, cada um pode usar sua própria razão nos momentos de perigo, para salvar sua vida, seja pela fuga ou pela sujeição ao inimigo, conforme achar melhor. Semelhante a uma pequena companhia de soldados, surpreendida por um exercito, pode baixar as armas e pedir quartel, ou então fugir, em vez de ser passada pela espada. (p. 154).
- Agora vamos ver o que as Escrituras ensinam relativamente às mesmas questões. Assim disseram a Moises os filhos de Israel [Ex. 20, 19]: “Fala-nos, e ouvir-te-emos; mas que Deus não nos fale, senão morremos”. Isso implica uma obediência absoluta a Moisés. (p. 154).
- Assim foi a oração do rei Salomão a Deus [I Rs 3, 9]: “Dá a teu servo entendimento para julgar teu povo, e para distinguir entre o bem e o mal”. Portanto, compete ao soberano ser juiz e prescrever as regras para distinguir entre o bem e o mal, regras estas que são as leis. Consequentemente é nele que reside o poder legislativo. (p. 155).
- [...] mesmo nosso salvador reconhece que os homens devem pagar os impostos exigidos pelos reis, quando diz: “Daí a Cesar o que é de Cesar”. Ele próprio pagava esse imposto. Reconhece também que a palavra do rei é suficiente para tirar qualquer coisa de qualquer súdito, quando tal é necessário, e que o rei é juiz dessa necessidade. Ele próprio, como rei dos judeus, ordenou aos discípulos que tomassem a burra e seu burrinho para levá-lo a Jerusalém, dizendo [Mt 21, 2s]: “Ide à aldeia que fica diante de vós, e lá encontrareis uma burra amarrada, e com ela seu burrinho; desamarrai-os e trazei-mos. E se alguém vos perguntar o que pretendeis, dizei que o senhor tem necessidade deles; e deixar-vos-ão partir”. Ninguém perguntará se essa necessidade constitui um direito suficiente, nem se ele é juiz dessa necessidade, mas simplesmente acatarão a vontade do senhor. (p. 155-156).
- Aparece bem claro a meu entendimento, tanto a partir da razão, quanto das Escrituras, que o poder soberano, quer resida num homem como numa monarquia, quer numa assembléia como nos Estados populares e aristocráticos, é o maio que é possível imaginar que os homens possam criar. (p. 156).
- Quem quer que considere demasiado grande o poder soberano procurará fazer que ele se torne menor. Para tal precisará submeter-se a um poder capaz de limitá-lo. Isto é, a um poder ainda maior. (p. 157).
- Nas nações cujos Estados tiveram vida longa e só foram destruídos pela guerra exterior, os súditos jamais discutiram o poder soberano. (p. 157).
- O talento de fazer e conservar Estados consiste em certas regras, tal como a aritmética e geometria, e não – como no jogo do tênis – apenas na prática. Regras essas que nem os homens pobres têm lazer, nem os homens que dispõe de lazer tiveram até agora curiosidade ou método suficiente para descobrir. (p. 157).

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