quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A FILOSOFIA NA ESCOLA PÚBLICA



Refletir sobre a sociedade como no todo – levando em consideração suas partes constitutivas, ou seja, suas especificidades – é, sem dúvida, um empreendido relevante rumo ao um conhecimento mais aperfeiçoado no que diz respeito àquilo que de mais íntimo ela tem, seja em termos de riqueza, seja em termos de miséria e tudo o que dessas duas fontes pode jorrar.
Ora, se o conhecimento de uma realidade é o ponto de partida para que nessa mesma realidade sejam operadas as mudanças necessárias, ou o aperfeiçoamento daquilo que já está posto, dada a não necessidade de mudar, então, nessa perspectiva, conhecer significa tomar posse dos instrumentos adequados à execução de uma determinada ação. Entretanto, é preciso ressaltar que o conhecimento não está dado, é, pois, fruto de uma construção gradativa; de uma formação metódica, disciplinada, rigorosa e crítica. Não tendo fonte única, constrói-se eficazmente a partir do diálogo com os diversos ramos do saber. Com essa proposta de aquisição do conhecimento para uma formação crítica, apta a contribuir para as transformações tanto quanto forem possíveis e necessárias, é que o projeto Filosofia na escola pública vem pensar a necessidade da formação filosófica para as crianças e adolescentes com o intuito de evitar a repetição de erros tais como se observa entre os adultos. Em outros termos, pode-se dizer que os idealizadores do projeto voltam sua atenção para a formação das crianças, haja vista, essa criança de hoje ser o adulto de amanhã. O que se objetiva, portanto, é a construção de uma sociedade e uma realidade melhor em termos de humanidade.
Cumpre ressaltar que os organizadores dessa proposta, a saber, Kohan, Bernardina Leal e Álvaro Ribeiro, com ênfase em educadores como, por exemplo, Lipman e Paulo Freire, dentre outros, organizaram sua reflexão abordando especificamente treze itens. Esses são: a crítica, a pergunta, a experiência, o diálogo, a criação, a resistência, a participação, o sentido, a insatisfação, a história (da filosofia), o sujeito, a infância e a amizade.   
No primeiro item, os autores objetivam, na perspectiva dos filósofos, um resgate do sentido histórico do conceito de crítica. Para isso, concentram suas analises tomando como referências, primeiro Kant, onde se defende a tese de que “a crítica tem haver com o reconhecimento de certos limites[1]; segundo, a escola de Frankfurt, de acordo com a qual
        
a crítica tem a função de impedir que os seres humanos se abandonem irrefletidamente àquelas idéias e formas de conduta instituída socialmente; ela é o esforço prático para não aceitar por simples habito as praticas e relações sociais dominantes.[2]

Esse conceito de crítica da escola frankfurtiana contribui relevantemente para o entendimento de autores como, por exemplo, Horkheimer e Adorno. Nesse último, a educação tem visa a emancipação. Essa, por sua vez, dar-se-á na medida em que o rompimento com as idéias dominantes passar a acontecer. É justamente nesse sentido que a crítica, enquanto parte constitutiva da formação, ganha relevância; e, terceiro, “uma reconsideração ética da tarefa educacional[3], onde se procura questionar sobre o sentido das ações.
O segundo item trata de mostra a pergunta como elemento fundamental para a formação filosófica. Elas são uma espécie de motor que a tudo impulsiona. É por meio dela que as verdades e conhecimentos já fixados podem vir a debate. De acordo com os autores, “as perguntas da filosofia não são colocadas para serem respondidas no sentido de serem resolvidas, mas para serem pensadas; e o pensamento não tem pontos de clausura[4]. Ou seja, por meio das perguntas, a filosofia também busca desconstruir o já construído para construí-lo novamente, nesse contexto, tudo vem a lume, tudo aflora.
O terceiro item, que enfatiza a experiência, com base em Adorno, vai mostra que “a educação para a experiência é a educação para a emancipação[5]. Ou seja, a experiência é o ato que, dentre outras finalidades, permite constatar se, de fato, a educação cumpriu com a sua função (enquanto buscava a emancipação) ou não.
O quarto item procura mostrar a importância do diálogo para o crescimento na diferença, uma vez que a diferença é o principal elemento que permite distinguir os seres uns dos outros, alem do que, em matéria de pensamento, ninguém pensa igual. O quinto item, discorrendo sobre a criação, enfatiza a importância de se criar conceitos, principalmente pelo fato de que isso ajuda na exploração da imaginação das crianças.   O sexto item aborda a resistência como fator relevante e necessário frentes à pressão exercida pelos interesses do mercado na era da globalização. Nesse sentido, o texto refere que “nunca antes as variadas formas culturais e sociais tiveram sua existência tão ameaçada por um modelo único e universal[6]. Nessa perspectiva, a educação ganha uma nova dimensão: educar para resistir, pois, a resistência, nesse contexto, é sinônimo de luta pela autonomia.  
Ao tratar da participação no sétimo item, o programa mostra a importância do engajamento dos indivíduos na vida da cidade. Para a isso a filosofia também pode dar a sua parcela de contribuição.

Queremos que todos os seres humanos façam parte da filosofia, não para que sejam filósofos, mas sim para que eles sejam capazes de articular por si mesmos a visão do mundo que norteia sua vida em sociedade. Importa-nos enfatizar a palavra “todos”, na medida em que não há razões para deixar alguém de fora. [7]  

Ou seja, o propósito é fazer com que todos se comprometam no processo de transformação e participação.
No oitavo item discute-se sobre o sentido da filosofia na escola. Este sentido consiste primordialmente no despertar para o pensamento crítico. No nono, ressalta-se a insatisfação como momento oportuno para o exercício do filosofar. O décimo item trata da história, mas especificamente a história da filosofia. No décimo primeiro a ênfase é dada no sujeito enquanto portador da faculdade de conhecer. Neste ponto também se discorre sobre a constituição da subjetividade onde é afirmado que “esse processo [...] não é vertical, de cima para baixo, mas multidirecional[8], em outros termos, caminha em varias direções, isto é, pode sofrer a influência do meio. O décimo segundo item que discorre sobre a infância mostra que uma das finalidades da filosofia na escola é formar pessoas menos ignorantes. Por fim, o décimo terceiro item que trata da amizade reflete que “a comunidade dos praticantes da filosofia é uma comunidade de amigos[9]. Como fundamento a esse raciocínio tem-se o pensamento de Aristóteles que concebe a comunidade como o lugar, por excelência, onde a vida se torna possível e o homem se desenvolve.






REFERÊNCIA
KOHAN, w. Omar, LEAL, Bernardino, RIBEIRO, Álvaro. Filosofia na escola pública. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. 


[1] KOHAN, w. Omar, LEAL, Bernardino, RIBEIRO, Álvaro. Filosofia na escola pública. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.  P. 25
[2] Id. Ibidem, P. 26
[3] Id. Ibidem, P. 27
[4] Id. Ibidem, P. 30
[5] Id. Ibidem, P. 30
[6] Id. Ibidem, P. 41
[7] Id. Ibidem, P. 46
[8] Id. Ibidem, P. 61
[9] Id. Ibidem, P. 68.

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