O capítulo XV de O
Príncipe possui uma relevância magnífica na obra de Maquiavel, sobretudo,
porque nele está contida aquela máxima do pensamento do florentino que demarca
definitivamente o seu rompimento com toda a tradição do pensamento político antigo
e medieval. Essa máxima – que aqui convém precisar – configura-se naquilo que
ele chamara de verdade efetiva das coisas,
a qual consistia em tomar as coisas, ou considerá-las a partir daquilo que elas
são no estágio concreto que expressa e possibilita do vir-a-ser delas, a
maneira como elas se nos aparecem e se nos dão. Com essa concepção, Maquiavel mostra
a sua contraposição em relação àqueles que se ocupavam de assuntos políticos,
no entanto, a partir daquilo que as coisas deveriam ser, como, por exemplo, Platão
e Aristóteles.
Não se harmonizando com a estrutura do antigo e medievo
pensamento político, Maquiavel critica, portanto, seus dois principais
expositores, mostrando que a preocupação com aquilo que deveria ser [em vez de ser
com aquilo que é] nada mais seria do que uma maneira de arruinar-se quem assim
procedesse. Com essa reflexão, o filósofo insinua que o príncipe deve ser um grande
observador da vida humana, isto é, observar as ações dos homens, seus
comportamentos e outras coisas, conforme se vê em outras partes da obra.
Como exemplo da verdade efetiva, pode-se tomar o próprio período
da Itália no qual vivera Maquiavel: um território fragmentado em estados
independentes e desarmônicos entre si. São exemplos: a República de Veneza, os
estados pontifícios, o ducado de Milão, a República de Florença e o Reino de
Nápoles. No tempo de Maquiavel, era essa a verdade efetiva das coisas, a
realidade concreta a partir da qual ele formula o seu pensamento político.
Se no contexto da Idade Média o homem estava voltado para
a contemplação, com Maquiavel ele tende para a ação, isto porque uma das preocupações
desse autor consiste em tornar o homem consciente de sua realidade, a qual é
problemática, complexa e difícil. Tornar o homem consciente de sua realidade,
nesse contexto, equivale a despertá-lo à ação. Essa complexidade se dá,
sobretudo, em razão do fato de que o homem muda a todo instante, de modo que
não se pode esperar dele ser hoje aquilo que ilustrara ser ontem. Em suma, a
preocupação política de Maquiavel é com o presente, com a realidade concreta, a
verdade efetiva das coisas, o modo como elas se apresentam, aquilo que elas, de
fato, são.
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