quarta-feira, 7 de julho de 2010

OBRA DE ARTE E MODERNIDADE



Se no contexto da idade media, a obra de arte estava restrita aos locais de culto, sob a tutela da tradição religiosa; se nesse contexto ela (a obra de arte) é identificável especificamente por seu caráter puramente ritualista; e se nesse período, ela constitui uma espécie de mediação entre o fiel e a supremacia divina, é por que isso se deveu, antes de tudo, ao fato de que, nessa época, os mosteiros se constituíram como o seu único e primordial recinto.
De acordo com Benjamin

O culto foi a expressão original da integração da obra de arte no seu contexto tradicional. Como sabemos, as obras de artes mais antigas surgiram ao serviço de um ritual, primeiro mágico e depois religioso [...] em outras palavras: o valor singular da obra de arte “autentica” tem o seu fundamento no ritual em que adquiriu seu valor de uso original e primeiro. (BENJAMIN, s/d. p. 82).

Nota-se, portanto, que inicialmente, era no uso ritualístico que repousava o verdadeiro sentido e valoração da obra de arte. Percebe-se, desse modo, a ausência de qualquer interesse econômico nessa relação do homem com a grandeza da criação artística. Na modernidade, porém, essa pureza no sentido dessa relação primeira desaparece. A obra de arte vai se tornar, então, objeto de comércio, de compra e venda, ou mesmo de troca. Ou seja, na modernidade o valor de uso da obra de arte passa a ditado pela moeda e não mais pelo culto dos mosteiros, ao qual ela estava presa anteriormente.
O advento gradativo do progresso, com o passar do tempo, fez com que essa realidade do período medieval adentrasse num processo de mutação inevitável. Nesse cenário de evolução – fruto das mudanças que vinham ocorrendo em praticamente todos os setores da sociedade, como por exemplo, na própria economia – dá-se então a ruptura da obra de arte com a instituição religiosa. O ponto de partida dessa ruptura foi justamente aquilo que, em Walter Benjamin, por exemplo, ficou conhecido como reprodutibilidade técnica da obra de arte. Nessa perspectiva, Benjamin refere que

A reprodutibilidade técnica da obra de arte emancipa-a, pela primeira vez na história do mundo, da sua existência parasitária no ritual. A obra de arte reproduzida, torna-se cada vez mais a reprodução de uma obra de arte que assenta na reprodutibilidade. (BENJAMIN, s/d. p. 83).
Em uma outra passagem ele vai dizer que com a reprodutibilidade técnica, a obra de arte passou a ficar mais tempo exposta, donde se conclui que a partir de então, ela vai está voltada para o mercado, para o consumo, isto é para as massas. Um ponto relevante que pode ser notado é quando Benjamin afirma que

Mesmo na reprodução mais perfeita falta uma coisa: o aqui e agora da obra de arte – sua existência única no lugar em que se encontra. [...]. O aqui e agora do original constitui o conceito da sua autenticidade. [...]. Mas enquanto o autentico mantém a sua autoridade total relativamente à sua reprodução manual que, regra geral, é considerada uma falsificação, isto não sucede relativamente à reprodução técnica. (BENJAMIN, s/d).

Embora a reprodutibilidade tenha ocasionado a emancipação da arte, ela ainda não é suficiente para assegurar o caráter autêntico da obra de arte, pelo contrário, o que ocorre é justamente uma perda dessa autenticidade, sobretudo, porque diante do fenômeno da reprodução perde-se consideravelmente a capacidade de se dizer o que é original e o que não é. Nesse sentido, Benjamin refere que “o que murcha na era da reprodutibilidade técnica da obra de arte é a sua aura” (BENJAMIN, s/d, p. 79). Essa aura da obra de arte corresponde precisamente à sua originalidade que na sociedade de massa se dilui na multidão.
Segundo o Benjamin

No início do século XX, a reprodução técnica tinha atingindo um nível tal que começara a tornar objeto seu, não só a totalidade da obra de arte proveniente de épocas anteriores, e a submeter os seus efeitos às modificações mais profundas, como também a conquistar o seu próprio lugar entre os procedimentos artísticos. (BENJAMIN, s/d. p. 76-77). 
  

Ou seja, a própria reprodutibilidade parece ter passado por um processo de aperfeiçoamento de sorte que lhe propiciou a conquista de um próprio espaço. Certamente, essa conquista não teria sido alcançada se o conhecimento não tivesse evoluído. O conhecimento permitiu ao homem melhor dominar os equipamentos técnicos. Tudo isso atrelado ao mercado, contribui, indubitavelmente, para os avanços e conquistas do processo de reprodução.
Na sociedade de massa, por exemplo, onde a cultura passa a ser produzida em função do seu valor de troca, a reprodutibilidade técnica passar a ter uma relevante capital no que diz respeito a busca de riquezas. É importante lembrar também que a obra de arte na modernidade e na própria sociedade de massas não se tornou um elemento somente capaz de gerar riqueza, mas também um meio de garantir a própria sobrevivências de muitos artistas. Nesse contexto, a ideia de obra de arte, que é a ideia do que é belo, passa a ser uma controvérsia nesse tipo de sociedade (massa), onde os objetos culturais são produzidos e reproduzidos para atingir o mercado. Benjamin refere que “o primeiro meio de reprodução verdadeiramente revolucionário foi a fotografia” (BENJAMIN, s/d. p. 83). O aparecimento da fotografia vai inaugurar, na reprodutibilidade e na sociedade de massa, uma espécie de cultura voltada para o consumo das imagens. Nessa perspectiva, a fotografia também contribui em demasia para a perda da aura da medida em que não possibilita determinar a autenticidade no sentido de dizer o que é original e o que não é.

Depois de libertar-se da tradição religiosa, a que estava presa no decorrer da Idade Média, na modernidade a arte vai cumprir com uma função social indissoluvelmente atrelada ao mercado. É importante lembra que o comércio, na modernidade, vai se beneficiar com a prática da reprodutibilidade, sobretudo, por causa do aumento das oportunidades de exposição de seus produtos. Essa função social da arte na modernidade, voltada ao interesse do mercado, vai ser marcado principalmente pelo progresso contínuo e intenso que, como uma tempestade, não permite que o indivíduo olhe para traz. Nesse cenário de ruptura com os ideias medievais, a modernidade vai se construindo a partir da destruição do velho para a construção de novo artístico.
Com essas reflexões, Benjamin quer mostrar os sinais de uma cultura que se transforma, onde tudo se modifica. A arte, no âmbito da práxis política, vai ser uma espécie de auxílio na manutenção da continuidade dos grupos dominantes, sobretudo, a partir do uso da imagem, tal como se vê, por exemplo, em nossos dias.



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