SILVA, Maria Abadia da. Intervenção e consentimento: a
política educacional do Banco Mundial. Campinas: FAPESP, 2002.
- Este estudo afirma que as políticas de educação
básica estão alinhando-se, cada vez, mas, às políticas e às estratégias
deliberadas e aprovadas pelo Banco Mundial. A tese defendida é que a
intervenção das instituições financeiras internacionais nas políticas para a
educação básica pública, advindas de anos anteriores e aceleradas pelas
circunstâncias internacionais das ultimas décadas conta com o consentimento do
governo federal, de parte dos estaduais, e das elites dirigentes para a sua
efetivação. Sob a aparência de políticas para a realidade nacional, tem captado
e introjetado o ideário político e filosófico externo. Especialmente nas
décadas de 1980 e 1990, com a anuência do governo federal, dos ministros e dos
secretários dos estados, ainda que ocorram resistências dos sindicatos,
associações, de partidos de esquerdas e das entidades não governamentais.
”(pág. 81)
- Em relação aos anteriores, nos anos de 1990, os
documentos do Banco Mundial (1992
a , 1995
a , 1995 c), afirmam categoricamente as políticas
setoriais para os distintos níveis e modalidades de ensino. Quantos aos
conceitos analíticos o banco faz uma reconceituação das necessidades básicas de
aprendizagem e da pobreza, segundo os interesses político-ideológicos e
resultados prescritos a priori... ”(pág.
83)
- No decorrer da analise dos documentos
encontraram-se as exigências estabelecidas na minuta de negociação e no manual
de operação e implantação de projetos e os princípios, objetivos e estratégias
educacionais, como, por exemplo, o aumento do tempo escolar, a ampliação da
duração do ciclo escolar, o aumento da capacidade de aprendizagem dos alunos. O
apoio à educação pré-escolar, a melhoria do ambiente de sala de aula, apoio ao
sistema de saúde e nutrição, a melhoria da capacidade dos docentes, a melhor
capacitação das habilidades pedagógicas e incrementos para ensinar, a
reestruturação administrativa e organizacional com desmembramento do sistema,
desenvolvimento das competências administrativas, criação do sistema de
avaliação por desempenho, o provimento de sistema de informações que contemplem
eficiências e organizacional, a persuasão dos pais acerca do valor da educação
e a mobilização da comunidade para os proventos econômicos. Não são raros os
casos em que as escolas carecem de serviço de manutenção básico e, neste caso,
a comunidade assume um serviço que é de
responsabilidade dos poderes constituídos. No trecho abaixo, constata-se a
transferências da responsabilidade pelo custo da educação publica à comunidade
e aos pais.”( pág.84)
- Por volta de 1995, o Banco Mundial seguia nas
seguintes frentes: colaborar com os países para que seus habitantes tivessem
maior acesso a serviços de qualidades e mais eficazes em função dos custos, desenvolver
programas de saúde e educação dirigidos às crianças, aplicar um política
democrática e a oferta de serviço de planejamento familiar e educação para a
mulher, incrementar programas direcionados à eliminação dos obstáculos que
impedem a participação da mulher no desenvolvimento econômico, reunir esforço
que assegurasse uma educação primaria de boa qualidade a todos e um conjuntos
mínimo de um serviço de saúde eficiente em função dos custos e acabar com a
desnutrição (Banco Mundial,1995d).”( pág. 86)
- Um dado a ser ressaltado no documento é a
referencia à dura fiscalização do governo sobre as escolas privadas,
inibindo-as e dificultando sua participação no desenvolvimento no livre mercado e de serem conduzidas pela mão
invisível. Segundo Friedman, “o crescimento da educação desviou-a do caminho
originário destinado a forma elite do poder ou dar a cada um o que a formação
social que lhe destinava. Por outro lado, o desenvolvimento do sistema estatal
reflete-se no surgimento de grandes instituições educativas que limitam as
possibilidades de escolha do consumidor, ao impedir o desenvolvimento das
unidades menores de oferta adaptadas a varias expectativas de país” (Friedman,
1980). Na verdade, o que está posto no argumento dos gestores externos é o principio
da competitividade e o livre mercado defendido por Friedrich Hayek (1977) e
Milton Friedman (1985), tratando a educação como mercadoria a ser comprada e
negociada de acordo com as forças do
mercado omitindo os custos sociais numa sociedade de classe em que os serviços
públicos sabiamente não rendem lucro, e por isso os clássicos do liberalismo
haviam atribuído ao Estado a responsabilidade de sua oferta publica. Segundo
entrevista do Sr. Gary Becker, premio Nobel de economia de 1992, “o financiamento
do ensino superior em detrimento dos estágios básicos é considerado um
equivoco. Os governos que assim o fazem estão subsidiando as pessoas erradas. O
papel do governo na promoção do capital humano é garantir o ensino primário e
secundário, que dê conhecimentos gerais ás pessoas”. É nessa lógica
credencialista para a educação publica que os gestores das instituições
externas fundam seus princípios
tornando-os equivalentes aos nacionais, com anuências dos membros do ministério
e das secretarias da educação”.
2.3
Anos de 1990: mudanças
nas políticas educacionais do Banco Mundial
- o secretário de educação não atua diferentemente, é
apenas um condutor da ideologia dominante e do aparato jurídico institucional
para enquadrar toda a comunidade escolar nos modelos desejados (p. 95).
- mesmo com distorções, resistências, modificações e
impossibilidades físicas, técnicas ou humanas, todas as escolas são controladas
e reordenadas. (p. 95).
- uma síntese crítico-reflexiva demonstra que as
políticas sociais, entre elas as políticas educacionais, são estabelecidas
pelas instituições financeiras internacionais, com a anuência dos governos e
das elites conservadoras locais. (p. 96).
- para elaborá-las, hierarquizá-las e priorizá-las,
ocorrem os embates político-econômicos e ideológicos entre as prescrições
externas, os pactos político-partidários de origem estatal empresariam e a
sociedade civil representada pelos cidadãos e pelas entidades acadêmicas e
sindicais. (p. 96).
- nesse sentido, intervir significas interpor sua
autoridade a favor de seus interesses. (p. 96).
- essa prática de intervenção externa tem sido utilizada
pelos Estados industrializados para lograr a predominância de suas políticas.
(p. 96).
- a via da intervenção acelerou-se, na década de
1980, por meio das ações diretas e sistemáticas, acrescidas dos empréstimos
solicitados, prioritariamente, ao Banco Mundial, que passou a ser com o Fundo
Monetário, o principal ator na determinação de políticas econômicas e
socioeducacionais. (p. 96).
- os projetos do Banco Mundial são de intervenção
sistemática e seus padrões de empréstimos e de juros condicionam os devedores a
estudos preliminares e a resultados a serem alcançados. (p. 96).
- um dos mecanismos de intervenção sistemática foi
desqualificar a produção do conhecimento e da ciência dos Estados
latino-americanos. Os economistas e técnicos do Banco Mundial propuseram as
seguintes medidas: reduzir o subsídio aos estudantes e cobrar pagamento de
matrícula, de mensalidades e de serviço com a finalidade de reduzir o excesso
de demanda para o ensino médio e superior e inibir que grande proporção de
alunos matriculados abandonem seus estudos. (p. 97).
- para o Banco Mundial, a estratégia política
funda-se numa política educacional de auto-sustentação financeira, mediante
redução de provimentos públicos e do incremento com o setor produtivo,
estabelecendo vínculos e parcerias das escolas de ensino médio e das universidades
com as empresas privadas e redireciona as demandas para as modalidades posteriores,
desconsiderando toda a complexidade do processo. (p. 97).
- o Banco Mundial opõe-se às políticas de gratuidade
para os níveis médio e superior, determinando que se contenham a demanda,
particularmente ao nível superior: divulga amplamente, como, política para o
ensino superior, procedimentos fundados na produtividade e na racionalidade
técnica para aferir produção de conhecimento; propõem o fim da gratuidade para
os estudantes, incluindo: cobrança de taxas, pagamentos para participação em
curso e contenção de recursos para serviço de participação e moradia. (p. 97-98).
- nada foi mencionado quanto à produção cientifica e
tecnológica enquanto principio de autonomia e de soberania nacional. (p. 98).
- as reformas do FMI / Banco Mundial desmantelam
brutamente os setores sociais dos países em desenvolvimento, anulando os
esforços e as lutas do período pós-colonial e revertendo com uma canetada o
progresso já conseguido. (p. 99).
- o Banco Mundial, juntamente com o Fundo Monetário,
impôs o ajuste estrutural às economias devedoras durante os anos de 1980. (p.
100).
- a aplicação desses princípios, defendidos pelos
gestores externos como necessários, e a sua reaplicação na educação publica
delineiam a intervenção calcada nas seguintes políticas: ênfase no ensino
fundamental em detrimentos dos demais níveis, nenhum acréscimo da parcela do
PIB para a educação, currículo direcionado para o mercado e para o consumo de
produtos importados, centralização dos conteúdos básicos – parâmetros
curriculares nacionais, flexibilização das formas de contratação de professores,
privatização gradual do ensino médio e superior, reclassificação dos alunos
etc. somam-se ainda, os programas de educação à distância, os telecursos 2000 e
a terceirização de serviços escolares. (p. 100).
- essas políticas, fundadas no pressuposto de que a
educação pública deve ser definida pelos instrumentos do mercado, revelam de
uma parte, a utilização da educação pública como instrumento de intervenção
eficaz. (p. 100).
- em cada estado e nos municípios, as políticas para
a educação básica pública implementadas refletem a intervenção da política
macroeconômica externa, como resultado da incapacidade dos governos para gerar
e produzir políticas sociais e educacionais independentes, mas soberanas. (p.
100).
4.
A ATUAÇÃO DO BANCO
MUNDIAL NA FORMAÇÃO DE POLÍTICAS E PROJETOS PARA A EDUCAÇÃO PÚBLICA
- alem dos recursos financeiros, o Banco Mundial
tornou-se a inteligência auxiliar dos governos latino-americanos na elaboração
de programas, de projetos setoriais de desenvolvimento, de combate à pobreza,
de reforma agrária com financiamento de compra das terras (p. 101).
- no período de 1985-1994, com o acirramento dos
desajustes sociais e econômicos, no âmbito interno, houve predominância das
políticas e das estratégias do Banco Mundial, incorporadas pelo Estado da
America Latina prestadores, gerando modificações na organização, no
funcionamento e no financiamento da educação pública (p. 101).
- a aproximação entre as duas equipes acentuo-se nos
anos de 1990, durante o governo de Fernanda Collor (1990-92), quando aderiu aos
postulados neoliberais prescritos no consenso de Washington. Na presidência
tomou medidas quanto à liberalização comercial, à política indústria e à
legislação brasileira no campo da informática (p. 102).
- quanto aos dados percentuais para a educação, no
período de 1987-1994, eles passaram de 2% para 29% do total de empréstimos
realizados pelo Banco Mundial (p. 102).
- do ponto de vista econômico, tradicionalmente o
país internacionalizou-se à custa da dependência, dos financiamentos externos e
dos constantes déficits na balança de pagamentos (p. 102).
- nos anos de 1990, estreitou-se a aproximação
sistemática entre as duas equipes e o resultado pode ser verificado na
aprovação de seis projetos para a educação básica pública com contrapartida dos
estados, dos municípios e da FNDE (p. 103).
- nas ultimas décadas, os projetos acordados foram:
Projeto Inovações no Ensino Básico do Estado de São Paulo, Projeto de Qualidade
no Ensino no Paraná, Projeto de Educação Básica do Estado de Espírito Santo,
Projeto Pró-Qualidade do Estado de Minas Gerais, Projeto Nordeste II, Projeto
Nordeste III. O que mais incomoda nestes projetos é a nula transparência do
conteúdo destes acordos (p. 103).
- os trâmites legais entre o Banco Mundial e o
governo do Brasil estão efetivados no documento “Estratégia de Assistência ao
País” (p. 103).
- no documento “Estratégia de Assistência do País”,
estão prescritos a estabilização econômica, o desenvolvimento e as reformas
institucionais (p. 104)
- os anos de 1990 reproduziram os insucessos
econômicos e sociais. Os programas de ajustes estruturais para a estabilização
da economia brasileira encontram-se num dilema: como explicar a estabilização
temporária dos preços e o fracasso simultâneo nas áreas de crescimento
econômico e da justiça social (p. 105).
- em seus discursos, os gestores do Banco Mundial
exigem a prioridade para o ensino fundamental – em detrimento da educação
infantil, do ensino médio, da educação de jovens e adultos, da educação indígena
e do ensino superior – como chave para o desenvolvimento, concebendo-o como
investimento necessário e de maior retorno que outros investimentos (p. 105).
- no documento “Educación Primária” (1992), o Banco
Mundial afirma ser a educação primaria o pilar do crescimento econômico e do
desenvolvimento social, alem de principal meio para promover o bem-estar das
pessoas (p. 105).
- nessa lógica, predominam a falta de qualificação
profissional, o esvaziamento dos conteúdos escolares e a desqualificação das instituições
educacionais (p. 105).
- os conteúdos distribuídos em séries, ciclos ou
módulos de ensino iniciam os indivíduos na tarefa de serem consumidores de
mercadorias, disponíveis para as demandas do mercado, ordeiros e com
competências rudimentares para fazer suas escolhas dentro daquilo que é
oferecido pelo mercado (p. 106).
- segundo os gestores do Banco, o grave problema
educacional do Brasil é a baixa qualidade, causa dos altos índices de
repetência e evasão (p. 106).
- e para melhorar a qualidade e a eficiência do
ensino, estabeleceram-se as seguintes estratégias: melhoria da capacidade de
aprendizagem do aluno, redução das altas taxas de repetência, aumento das
despesas por aluno (p. 106).
- No documento “Veinte años de ayuda del Banco
Mundial a La educación: presentación y evaluación”, foram expostos os objetivos
e as estratégias do Banco Mundial para a educação primaria, esclarecendo a
continuidade e os desdobramentos posteriores de sua política (p. 106).
- os técnicos do Banco Mundial, juntamente com parte
da equipe do ministério da educação brasileira, estabeleceram como estratégias
de melhoria da educação pública (p. 108):
*Providenciar
livros didáticos e outros matérias de ensino;
*Melhorar
as habilidades dos professores em técnicas de sala de aula;
*O estabelecimento de capacitação
permanente e de avaliações
institucionais;
*elevar a capacidade de gerenciamento
setorial, incluindo o estabelecimento da capacidade de monitorar;
*melhoria das instalações e equipamentos
escolares;
*assessorar o desempenho dos alunos,
implementando um sistema de avaliação permanente da educação básica (p. 108)
- no caso do projeto de educação básica para o
nordeste que abrangia nove estados, o objetivo
geral: é a melhoria da qualidade do ensino fundamental com ênfase nas
primeiras quatro séries, através do apoio financeiro a programas integrados
estados/municípios de investimento na educação (p. 108).
- durante o governo Itamar Franco (1992-1994)
criou-se a nova moeda, o Real, derivadas das negociações internas e externas
para vencer a inflação, consolidar a estabilização econômica, assegurar o
crescimento encabeçado pelo setor privado, atrair investimentos externos,
aprovar as reformas e induzir redução de gastos para as políticas públicas (p.
110).
- para contemplar seus interesses políticos e
subordinar a educação ao modelo econômico, prescreviam o barateamento dos
custos da educação para o setor público, a racionalização da oferta do ensino,
mediante adoção de alternativa extra-escolares (p. 112).
- o fundamento destas políticas para a educação estão
nos mesmos que alicerçam o modelo de desenvolvimento econômico (p. 112).
- as políticas para a educação emanadas do Banco
Mundial são de natureza discricionária-assistencialista e contencionista-reformista
(p. 113)
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