Fábio Coimbra[1]
HOBBES,
Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil.
Trad. Alex Marins, Ed. 2. São Paulo: Martin Claret, 2008.
Primeira parte
A RESPEITO DO HOMEM
Cap.1
SOBRE A SENSAÇÃO
- Referente ao pensamento dos homens,
considerá-los-ei primeiro isoladamente e depois em cadeias ou dependentes uns
dos outros. Isoladamente, cada um deles é uma representação ou aparência de alguma
qualidade ou outro acidente de um corpo exterior, o que normalmente se designa
um objeto. Esse objeto atua nos olhos, nos ouvidos e em outras partes do corpo
do homem. Pela forma variada como atua, produz aparência diversa. (P.
19).
- Todas
elas se originam naquilo que denominamos sensação, já que não há nenhuma concepção
do espírito do homem que não tenha tido origem, total ou parcial, nos órgãos do
sentido. Dessa origem deriva o restante. (P. 19).
- O motivo da sensação é o corpo exterior, ou objeto, que pressiona o
órgão próprio de cada sentido, de forma imediata como no paladar e tato, ou de
forma mediata, como na visão, na audição e no olfato [...]. A pressão,
pela mediação dos nervos e de outras cordas membranas do corpo, prolongada em
direção ao cérebro e coração, causa ali uma resistência, ou contrapressão, ou
esforço do coração para se transmitir; [...]. Esta aparência ou ilusão é que os
homens chamam de sensação; Consiste, no que se refere à visão, numa luz ou cor
figurada; em relação aos ouvidos, num som; em relação ao olfato, num cheiro, em
relação a língua e paladar, num sabor; e em relação ao resto do corpo, em frio,
calor, dureza, maciez e outras sensações tanto quantas discernimos pelo sentir.
(P. 19-20).
-
Embora, a certa distância, o objeto real pareça confundido com a aparência que
produz em nós, mesmo assim o objeto é uma coisa e a imagem ou ilusão uma outra.
De tal sorte que em todos os casos a
sensação nada mais é do que ilusão originária, causada pela pressão, isto é,
pelo movimento das coisas exteriores aos nossos olhos, ouvidos e outros órgãos
a isso determinados. (P. 20).
Cap. 2
SOBRE A IMAGINAÇÃO
Memória – Sonhos- Aparições ou visões –
Entendimento
- Homem nenhum duvida da veracidade da
afirmação que segue: quando algo está imóvel, permanecerá imóvel para sempre, a
menos que alguma coisa a agite. E não é fácil aceitar esta outra, de que quando
uma coisa está em movimento, permanecerá constantemente em movimento a menos
que algo a pare, muito embora a razão seja a mesma, isto é, nada pode
mudar por si só. (P. 21).
- Um
corpo em movimento move-se eternamente (a menos que algo o impeça), e seja o
que for que o faça, não o pode extinguir totalmente num só instante, mas apenas
com o tempo e gradualmente, como vemos acontecer com a água, pois, embora o
vento deixe de soprar, as ondas ainda rolam durante muito tempo. O mesmo
acontece naquele movimento que se observa nas partes internas do homem, quando
ele vê, sonha etc. [...] a imaginação
nada mais é, portanto, senão uma sensação diminuída, e encontra-se nos
homens, tal como em muitos outros seres vivos, estejam adormecidos ou
despertos. (P. 21)
- Em
vigília, a diminuição da sensação não é a diminuição do movimento feito na
sensação, mas seu obscurecimento, mais ou menos como a luz do sol obscurece a
luz das estrelas, as quais nem por isso deixam de exercer a atividade pela qual
são visíveis, durante o dia, menos do que à noite. Da mesma forma, entre as
muitas impressões que nossos olhos, ouvidos e outros órgãos recebem dos corpos
exteriores, só é sensível a impressão
dominante, assim também, sendo a luz do sol predominante, não somos
afetados pela luz das estrelas. (P. 21-22).
-
[...] quando queremos enfatizar a diminuição e significar que a sensação é
evanescente, antiga e passada, denomina-se memória. Nesse sentido, a imaginação e a memória são uma e a
mesma coisa, que, por razões várias, tem nomes diferentes. (P. 22).
- O acúmulo de memória ou memória de muitas coisas chama-se
experiência. A imaginação diz
respeito apenas àquelas coisas que foram anteriormente percebidas pela
sensação, de uma só vez, ou por parte, em varias vezes. A primeira [...] é a
imaginação simples, como quando imaginamos um homem ou um cavalo que vimos
antes; a outra é composta no caso de a partir da visão de um homem num
determinado momento, e de um cavalo em outro momento, concebemos, no nosso
espírito um centauro. (P. 22).
- Como na sensação o cérebro e os nervos
que constituem os órgãos necessários desta sensibilidade estão de tal modo
entorpecidos, facilmente são agitados pela ação dos objetos externo, não
podendo haver no sono qualquer imaginação ou sonho que não provenha de agitação
das partes internas do corpo. Estas
partes internas, pela conexão que tem com o cérebro e outros órgãos, quando
estão agitadas mantém esses órgãos em movimento. (P. 23).
- [...] contento-me com saber que, estando
desperto, não sonho, muito embora quando sonho, me julgo acordado. (P.
23).
-
Assentado que os sonhos são
provocados pela perturbação de algumas das partes internas do corpo,
perturbações diversas têm de causar sonhos diversos. (P. 23)
- em suma, os sonhos são o reverso das
imaginações despertas, iniciando-se o movimento por um lado quando estamos
acordados e por outro quando sonhamos. (P. 24).
- Tem-se maior dificuldade em discerni o
sonho dos pensamentos despertos quando, por qualquer razão, nos apercebemos de
que não dormimos, o que é fácil de acontecer a uma pessoa cheia de pensamentos
aflitivos e cuja consciência se encontra muito perturbada [...] (P.
24).
- A ignorância para distinguir sonhos de
outras ilusões fortes, a visão e a sensação, fez surgir, no passado, a maioria
das religiões dos gentios, os quais adoravam sátiros, faunos, ninfas e outros
seres semelhantes, e hodiernamente a opinião que a gente simples tem das fadas,
fantasmas e gnomos, e do poder das feitiçarias. (P.25).
-
cabe ao
homem sensato só acreditar naquilo que a razão lhe apontar como crível.
Caso desaparecesse esse temor
supersticioso dos espíritos, e com eles as idéias tiradas dos sonhos, as falsas
profecias e muitas outras coisas dele decorrentes, graças as quais
pessoas ambiciosas e astutas abusam da credulidade da gente simples, os homens estariam melhor preparados
para a obediência civil. (P. 25).
Cap. 3
SOBRE A CONSEQÜÊNCIA
OU CADEIA DE IMAGINAÇÕES
Cadeia dos pensamentos não-orientados –
Cadeia dos pensamentos regulados – Lembrança – Prudência – Sinais – Conjectura
do tempo passado
- Entendo por conseqüência, ou cadeia de
pensamento, a sucessão de um pensamento a outro, que se denomina, para se
distinguir do discurso em palavras, discurso mental. (P. 26).
- Assim
como não temos uma imaginação da qual não tenhamos tido antes uma sensação, na
sua totalidade ou em parte, do mesmo modo não temos ligação de uma imaginação a
outra se não tivermos tido previamente o mesmo nas nossas sensações. A
razão disto é a seguinte: todas as
ilusões são movimentos interiores, vestígios daqueles que foram produzidos nas
sensações; aqueles movimentos que imediatamente se sucedem uns aos
outros na sensação continuam também juntos depois da sensação. (P. 26).
-
Diz-se que os pensamentos vagueiam e parecem impertinentes uns aos outros [...]
o homem pode, muitas vezes, perceber o seu curso e a dependência de um
pensamento em relação a outro. (P. 27).
- A
impressão feita por aquelas coisas que desejamos, ou receamos, é forte e
permanente, ou, quando cessa por algum momento, é de rápido retorno. [...] Do desejo surge o pensamento de algum
meio que vimos produzir algo semelhante àquilo que almejamos [...]. (P.
27).
- [...] em todas as nossas ações devemos
olhar muitas vezes para aquilo que queremos ter, pois desse modo concentramos o
nosso pensamento na forma de atingir o objetivo. (P. 27).
- De
duas espécies é a cadeia de pensamentos regulados: uma, quando a partir de um
efeito imaginado, procuramos as causas ou meios que os produziram, e esta
espécie é comum ao homem e a todos os animais; a outra é quando, imaginando
seja o que for, procuramos todos os possíveis efeitos que podem por intermédio
dessa coisa ser produzidos ou, em outras palavras, imaginamos o que
podemos fazer com ela, quando a tivermos. Desta espécie só tenho visto indícios
nos homens, pois se trata de uma curiosidade pouco provável na natureza de
qualquer ser vivo [...]. (P. 28).
- Algumas vezes o homem deseja conhecer o
motivo de uma ação. Pensa em alguma ação semelhante no passado, e no
sequenciamento delas, passo a passo, supondo que acontecimentos semelhantes se
devem seguir a ações semelhantes. (P. 28).
- A
esse tipo de pensamento se chama previsão, prudência ou providência, e algumas
vezes sabedoria, embora tal conjetura, devido a dificuldade de observar todas
as circunstâncias, seja muito enganosa. Porém isto é certo: quanto mais experiência das coisas
passadas tiver um homem, tanto mais prudente é, e suas previsões raramente
falham. (P. 28-29).
- O melhor profeta naturalmente é o melhor
adivinho, e o melhor adivinho é aquele mais versado e erudito nas questões que
adivinha, pois tem maior número de sinais pelos quais se guiar. Um sinal é o evento antecedente do
conseqüente, e contrariamente, o conseqüente do antecedente, quando
conseqüências semelhantes foram anteriormente observadas. (P. 29).
- No entanto, não é a prudência que
distingue os homens dos animais. Há animais que com um ano observam mais e
alcançam aquilo que é bom para eles de maneira mais prudente do que jamais uma
criança poderia fazer com dez anos. (P. 29).
- Assim
como a prudência é uma suposição do futuro, tirada da experiência dos tempos passados, também há uma suposição das
coisas passadas tiradas de outras coisas, não futuras, mas também passadas.
(P. 29).
- O
que imaginarmos será finito. Portanto, não existe qualquer idéia ou concepção
de algo que possamos denominar infinito. Nenhum
homem pode ter em seu espírito uma imagem de magnitude infinita, nem conceber
uma velocidade infinita, um tempo infinito, ou uma força infinita ou um poder
infinito. Quando dizemos que alguma coisa é infinita, queremos apenas dizer que
não somos capazes de conceber os limites e fronteiras da coisa designada, não
tendo concepção da coisa, mas de nossa própria incapacidade. (P. 30).
Cap. 4
SOBRE A LINGUAGEM
Origem da linguagem – O uso da linguagem
– Abusos da linguagem – Nomes próprios e comuns – Universais – Necessidades das
definições – Objeto dos nomes – Uso dos nomes positivos – Nomes negativos e
seus usos – Palavras insignificantes – Entendimento – Nomes inconstantes
- Ignora-se
quem descobriu o uso das letras. Diz-se que o primeiro que as trouxe para a
Grécia foi Cadmus, filho de Agenor, rei da Fenícia. Invenção fecunda
para prolongar a memória dos tempos passados e estabelecer a conjunção da
humanidade dispersa por tantas e tão
diferentes regiões da terra. (P. 31).
- Mas
a mais nobre e útil de todas as invenções foi a da linguagem, que consiste em
nomes ou apelações e em suas conexões, pelas quais os homens registram seus
pensamentos, os recordam posteriormente e também os usam entre si para fins
uteis e conversas recíprocas, sem o que não haveria entre os homens Estado,
sociedade, contrato, paz, tal como não existem entre os leões, os ursos e os lobos.
(P. 31).
- Toda
esta linguagem adquirida e aumentada por Adão e sua posteridade, foi novamente
perdida na torre de Babel, quando pela mão de Deus, todos os homens foram
punidos, devido a sua rebelião, pelo esquecimento de sua primitiva linguagem.
Sendo, depois disso, forçados a dispersar-se pelas varias partes do mundo,
resultou necessariamente que a diversidade de línguas hoje existentes proveio
gradualmente dessa separação [...].
(P. 31-32).
- Passar nosso discurso mental para um
discurso verbal, ou cadeia de nossos pensamentos para uma cadeia de palavras,
caracteriza o uso da linguagem. [...] a primeira utilização dos nomes
consiste em servir de marcas ou notas de lembranças. (P. 32).
- Os usos especiais da linguagem são os
seguintes: primeiramente, registrar
aquilo que descobrimos ser a causa de qualquer coisa, presente ou
passada, e aquilo que achamos que as coisas presentes ou passadas podem
produzir ou causar, o que em suma é adquirir artes. A seguir, para mostrar aos outros aquele conhecimento que
atingimos, ou seja, aconselhar e ensinar uns aos outros. Em terceiro
lugar, para dar a conhecer aos outros
nossas vontades e objetivos, a fim de podermos obter ajuda. Em quarto
lugar, para agradar e para nos
deliciar, e aos outros, jogando com as palavras, por prazer e
ornamento, de maneira inocente. (p. 32).
- Quatro abusos correspondem a esse uso.
Primeiro, quando os homens registram
erradamente seus pensamentos pela inconstância da significação de suas palavras,
com as quais registram como, suas concepções
aquilo que nunca conceberam e, desse modo, se enganam. Em segundo lugar,
quando usam palavras de maneira metafórica, ou seja, com sentido diferente
daquele que foi atribuído às palavras. Em terceiro lugar, quando por
palavras declaram ser sua vontade aquilo que não é. Em quarto lugar,
quando as usam para se ofender uns aos outros, dado que a natureza armou os seres vivos uns com dentes, outros com
chifres, e outros com mãos para atacar o inimigo, nada mais é do que um abuso
da linguagem ofendê-lo com a língua, amenos que se trate de alguém que somos
obrigados a governar, mas não é ofender, e, sim, corrigir e punir. (p.
32-33).
- A
linguagem é útil para a recordação das conseqüências de causas e efeitos, por
meio da imposição de nomes e da conexão destes. (P. 33).
- Um nome universal é atribuído a muitas
coisas, devido a sua semelhança em alguma qualidade ou outro acidente. Enquanto o nome próprio traz ao espírito
uma coisa apenas, os universais recordam qualquer dessa muitas coisas.
(p. 33).
-
[...] o uso de palavras para registrar nossos pensamentos não é tão evidente
como na numeração. Um louco de nascença que nunca conseguisse aprender de cor a
ordem das palavras numerais, como um, dois, três, pode observar cada uma das
pancadas de um relógio e acompanhar com a cabeça, ou dizer um, um, um, mas
nunca pode saber que horas são. (p. 34).
-
[...] sem palavras não há qualquer possibilidade de reconhecer os números e
muito menos as grandezas, a velocidade, a força e outras coisas, cujo calculo é
necessário á existência ou ao bem-estar da humanidade. (p. 34).
- O verdadeiro e o falso são atributos da
linguagem e não das coisas. Onde não houver linguagem, não há nem verdade nem
falsidade. (p. 34-35).
- [...] a verdade consiste na adequada
ordenação de nomes em nossas afirmações. (P. 35).
-
[...] em geometria, [...] os homens começam estabelecendo as significações de
suas palavras. A esse estabelecimento de significações chamam definições, e
colocam-nas no início de seu cálculo. [...] é necessário a qualquer pessoa que aspire a um conhecimento
verdadeiro examinar as definições dos primeiros autores [...]. (p. 35).
- [...] na correta definição de nomes
reside o primeiro uso da linguagem, o qual consiste na aquisição de ciência; e
na incorreta definição, ou na ausência de definições, reside o primeiro abuso,
do qual resultam todas as doutrinas falsas e destituídas de sentido [...].
(P. 35).
- Entre a verdadeira ciência e as
doutrinas errôneas situa-se a ignorância. (p. 35).
- A natureza em si não pode errar; e à
medida que os homens adquirem abundancia de linguagem, vão-se tornando mais
sábios ou mais loucos do que habitualmente. Nem é possível sem letras que um
homem se torne extraordinariamente sábio, ou extraordinariamente louco, a menos
que sua memória seja atacada por doença ou tenha deficiência na constituição
dos órgãos. (p. 35-36).
- As palavras são os calculadores dos
sábios que só com elas calculam. (p. 36).
- Os
latinos chamavam aos cômputos de moeda ratione, e ao cálculo ratiocinatio [...]
parece daí resultar a extensão da palavra ratio a faculdade de contar em todas
as outras coisas. Os gregos têm uma só palavra, logos, para linguagem e razão.
Não que eles pensassem que não havia linguagem sem razão, mas, sim, que não
havia raciocínio sem linguagem. (P. 36).
- Sempre
que qualquer afirmação seja falsa, os dois nomes pelos quais é composta, postos
lado a lado e tornado num só, não significam absolutamente nada. Por
exemplo, se for uma afirmação falsa dizer “um quadrângulo é redondo”, a
expressão quadrângulo redondo nada significa e é um simples som. (p. 37).
- [...] se a linguagem é peculiar ao homem
[...], o entendimento lhe é peculiar. (p. 38).
-
[...] os nomes são impostos para significar nossas concepções [...], nossas
afeições nada mais são do que concepções, quando concebemos as mesmas coisas de
forma diferente [...]. (p.38).
Cap. 5
SOBRE A RAZÃO E A
CIÊNCIA
O que é a razão – Definição de razão –
Onde está a reta razão – O uso da razão – Do erro e do absurdo – Causas do
absurdo – Ciência – Prudência e sapiência, e diferença entre ambas – sinais da
ciência
- Raciocinando alguém, nada mais faz do
que conceber uma soma total, a partir da adição de parcelas, ou conceber um
resto a partir da subtração de uma soma por outra [...]. (p. 39).
- Os
escritores de política adicionam em conjunto pactos para descobrir os deveres
dos homens. Os juristas somam leis e fatos para descobrir o que é certo e é
errado nas ações dos homens privados.
[...] seja em que matéria for que
houver lugar para a adição e para subtração, há também lugar para a razão. Onde
aqueles não tiverem o seu lugar, também a razão nada tem a fazer. (p. 39).
- Razão [...] nada mais é do que cálculo,
isto é, adição e subtração das conseqüências de nomes gerais estabelecidos para
marcar e significar nossos pensamentos. [...] marcar quando calculamos para nós próprios, e significar
quando demonstramos ou aprovamos nossos cálculos para os outros homens. (p.
39).
- [...] quando há controvérsia a propósito
de um cálculo as partes têm de, por acordo mútuo, recorre a uma razão certa, à
razão de algum arbitro, ou juiz, a
cuja sentença se submetem, a menos que sua controvérsia se desfaça e permaneça indecisa por falta de uma razão
certa constituída pela natureza. (p. 40).
- O uso e finalidade da razão não é descobrir
a soma e a verdade de uma, ou várias conseqüências, afastadas das primeiras
definições, e das estabelecidas significações de nomes, mas começar por estas e
seguir de uma conseqüência para outra. (p. 40).
-
[...] o erro é apenas uma ilusão, ao presumir que algo aconteceu, ou está para
acontecer, acerca do que, muito embora não tivesse acontecido, não existe,
contudo, nenhuma impossibilidade aparente. (p. 41).
- Os homens todos, por natureza,
raciocinam de forma semelhante, e bem, quando têm bons princípios. (p.
43).
- [...]
a razão não nasce conosco como a sensação e a memória, nem é adquirida apenas
pela experiência, como a prudência, mas obtida com esforço, primeiro por meio
de uma adequada imposição de nomes, e em segundo lugar por intermédio de um método
bom e ordenado de passar dos elementos, que são nomes, a asserções feitas por
conexão de um deles com o outro, e daí para os silogismos, que são as conexões
de uma asserção com outra, até chegar ao conhecimento de todas as conseqüências
de nomes referentes ao assunto em questão. A isso os homens chamam
ciência. [...] a ciência é o conhecimento das conseqüências [...]. (p.
43).
- [...] as crianças não são dotadas de
razão nenhuma até que atinjam o uso da linguagem, mas são denominadas seres
racionais devido a aparente possibilidade de terem o uso da razão na sua devida
altura. (p. 43).
- [...]
a luz dos espíritos humanos são as palavras claras, meridianas, mas
primeiramente limpas por meio de exatas definições e purgadas de toda
ambigüidade. A razão é o passo, o aumento da ciência
o caminho, e o beneficio da humanidade é o fim. De outro lado, as metáforas e as palavras ambíguas e
destituídas de sentido são como ignes fatui, e raciocinar com elas é o mesmo
que perambular entre inúmeros absurdos. (p. 44).
- Uns
certos e infalíveis, outros incertos, assim são os sinais da ciência. Certos
quando aquele que aspira à ciência de alguma coisa sabe ensinar a matéria, isto
é, demonstrar sua verdade de maneira perspícua a alguém. Incertos quando apenas alguns eventos
particulares correspondem à sua pretensão e em muitas ocasiões se revelam da
maneira que ele diz que deviam acontecer. (p. 44).
Cap.6
SOBRE
A ORIGEM INTERNA DOS MOVIMENTOS VOLUNTÁRIOS CHAMADOS PAIXÕES E A LINGUAGEM QUE
OS EXPRIME
Movimento vital e animal – o esforço – o apetite – o
desejo – a fome – a sede – a aversão – o amor – o desprezo – o bem – o mal – o
pulchrum – o turpe – o delicioso – o proveitoso – o desagradável – o
inaproveitável – o deleite – o desprezo – o prazer – a ofensa – os prazeres dos
sentidos – os prazeres do espírito – a alegria – a dor – a tristeza – a
esperança – o desespero – o medo – a coragem – a cólera – a confiança – a
desconfiança – a indignação – a benevolência – a bondade natural – a cobiça – a
ambição – a pusilanimidade – a magnanimidade – a valentia – a liberdade – a
mesquinhez – a amabilidade – a concupiscência natural – a luxuria – a paixão –
o amor – o ciúme – a vingança – a curiosidade – a religião – a superstição – a
verdadeira religião – o terror pânico – a admiração – a glorificação – a
vangloria – o desalento – o entusiasmo súbito – o riso – o desalento súbito – o
choro – a vergonha – o rubor – a imprudência – a piedade – a crueldade – a
emulação – a inveja – a deliberação – a vontade – as formas de linguagem na
paixão – o bem e o mal aparentes – a felicidade – o louvor – a exaltação
- Nos animais há dois tipos de movimentos
que lhes são próprios. Um deles chama-se vital: começa com a geração e continua
sem interrupção durante toda a vida. Deste tipo são a circulação do sangue, o
pulso, a respiração, a digestão, a nutrição, a excreção etc. [...] O outro tipo
é o dos movimentos animais também chamados movimentos voluntários, como andar,
falar, mover qualquer dos membros da maneira como anteriormente foi imaginada
pela mente. (p. 45-46)
- A sensação é o movimento provocado nos
órgãos e partes inferiores do corpo do homem pela ação das coisas que vemos,
ouvimos etc. A imaginação é apenas o resíduo do mesmo movimento, que permanece
depois da sensação [...]. (p. 46).
- [...] a imaginação é a primeira origem
interna de todos os movimentos voluntários. (p. 46).
-
Embora os homens sem instrução não concebam que haja movimento quando a coisa
movida é invisível ou quando o espaço onde ela é movida, devido a sua pequenez,
é insensível, não obstante esse movimento existe. (p. 46).
-
Estes pequenos inícios do movimento, no interior do corpo do homem, [...]
chamam-se esforço [...]. Quando vai em direção de algo que o causa, esse
esforço chama-se apetite ou desejo. [...] quando o esforço vai no sentido de
evitar alguma coisa chama-se geralmente aversão. (p. 46)
- Apetite e aversão são palavras que vem
do latim, e ambas designam movimentos, uma de aproximação e outra de
afastamento. (p. 46)
- Daquilo que os homens desejam se diz
também que o amam e que odeiam aquelas coisas pelas quais sentem aversão.
De modo que desejo e amor são a mesma coisa, salvo que por desejo sempre se quer
significar a ausência do objeto e quando se fala em amor geralmente se quer
indicar a presença. Também por aversão se quer designar a ausência e
quando se fala de ódio pretende-se indicar a presença. (p. 46-47)
- [...] das coisas que inteiramente
desconhecemos, ou em cuja existência não acreditamos, não podemos ter outro
desejo que não o de provar e tentar.(p. 47)
- Daquilo
que não desejamos nem odiamos se diz que desprezamos. (p. 47)
-
Como a constituição do corpo de um homem se encontra em constante modificação,
é impossível que as mesmas coisas nele provoquem sempre os mesmos apetites e
aversões e muito menos é possível que os homens coincidam no desejo de um só e
mesmo alvo. (p. 47).
-
seja qual for o objeto do apetite ou desejo de qualquer homem, esse objeto é
aquele a que cada um chama bom; ao objeto de seu ódio e aversão chama mau, e ao
de seu desprezo chama vil e indigno. (p. 47).
- [...]
nem há qualquer regra comum do bem e do mal que possa ser extraída da natureza
dos próprios objetos. Ela só
pode ser tirada da pessoa de cada um, quando não há Estado, ou então,
num Estado, da pessoa que representa cada um [...]. (p. 47).
- Aquilo que realmente está dentro de nós
é apenas movimento, tal como na sensação, provocado pela ação dos
objetos externos [...]. (p. 48).
- Chama-se esperança o apetite ligado à
crença de conseguir. Sem essa crença, o apetite chama-se desespero. [...]
Chama-se confiança em si mesmo a esperança constante. Chama-se desconfiança em
si mesmo o desespero constante. [...] Chama-se benevolência, boa vontade,
caridade o desejo do bem dos outros. [...] Chama-se cobiça o desejo do bem dos
outros [...]. Chama-se pusilanimidade
o desejo de coisas que só contribuem um pouco para nossos fins e o medo das
coisas que constituem apenas um pequeno impedimento. (p. 49).
- Chama-se concupiscência natural o amor
pelas pessoas apenas sob o aspecto dos prazeres dos sentidos. (p. 50).
- O
porquê, o como e o desejo de saber chamam-se curiosidade, e não existe em
qualquer criatura viva a não ser no homem. Dessa forma, não é só por
sua razão que os homens se distinguem dos outros animais, mas também por sua
singular paixão. Nos outros animais o apetite pelo alimento e outros prazeres
dos sentidos predominam de tal modo que impedem toda preocupação com o
conhecimento das causas, o qual é um desejo do espírito que, [...] supera a
fugaz veemência de qualquer prazer carnal. (p. 50)
- Causado pelos poderes invisíveis,
inventados pelo espírito ou imaginados a partir de relatos publicamente
permitidos, chama-se religião o medo daí advindo; quando esses não são
permitidos chama-se superstição. Quando o poder imaginado é realmente como o
imaginamos, chama-se verdadeira religião. (p. 50)
- Chama-se admiração a alegria ao saber de
uma novidade; é própria do homem porque desperta o apetite de conhecer
a coisa. (p. 50).
- Chama-se vangloria a invenção ou
suposição de capacidades que se sabe não possuir [...]. (p. 51).
-
[...] um excesso de riso perante os defeitos dos outros é sinal de
pusilanimidade. Porque o que é
próprio dos grandes espíritos é ajudar os outros a evitar o escárnio e
comparar-se apenas com os mais capazes. (p. 51).
- É
a vergonha a tristeza devida à descoberta de alguma falta de capacidade, a
paixão que se revela através do rubor. (p. 51)
- Chama-se imprudência o desprezo pela boa
reputação. (p. 52)
- Chama-se piedade a tristeza perante a
desgraça alheia, e surge do imaginar que a mesma desgraça poderia
acontecer a nós mesmo. (p. 52)
- Chama-se crueldade o desprezo ou pouca
preocupação com a desgraça alheia, que deriva da segurança da própria
fortuna. Pois considero inconcebível que alguém possa tirar prazer dos grandes
prejuízos alheios, sem que tenha um interesse pessoal no caso. (p. 52)
Cap. 7
SOBRE OS FINS OU
RESOLUÇÃO DO DISCURSO
O juízo ou sentença final – A dúvida – A
ciência – A opinião – A consciência – A crença – A fé
- Em
todo discurso, governado pelo desejo de conhecimento, há pelo menos um fim,
quer seja para conseguir ou evitar alguma coisa. Onde quer a cadeia de discurso seja interrompida existe um fim
provisório. (p. 55)
- Se
for apenas mental, o discurso consistirá em pensamentos de que uma coisa será
ou não, de que ela foi ou não foi, alternadamente. (p. 55).
-
Tal como o último apetite na deliberação se chama vontade, assim também, a
última opinião na busca da verdade sobre o passado e o futuro chama-se juízo,
ou sentença final e decisiva daquele que discursa. (p. 55).
- [...] o conjunto da cadeia de opiniões
alternadas, quanto ao problema da verdade e da falsidade, se chama dúvida.
(p. 55).
-
[...] nenhuma espécie de discurso pode terminar no conhecimento absoluto dos
fatos passados ou vindouros. Porque para
o conhecimento dos fatos é necessário primeiro a sensação e depois disso a
memória, e o conhecimento das conseqüências, que acima já disse chamar-se se
ciência, não é absoluto, mas condicional. (p. 55).
-
Ninguém pode saber, por meio do discurso, que isto ou aquilo é, foi ou será, o
que equivale a conhecer absolutamente. É possível apenas saber que, se isto é,
aquilo também é; que, se isto foi, aquilo também foi; e que se isto será,
aquilo também será; o que equivale a conhecer condicionalmente. (p. 55-56).
- Quando o discurso é expresso por meio da
linguagem, portanto, começa pela definição das palavras e procede mediante a
conexão destas em afirmações gerais, e posteriormente em silogismos. O fim ou
soma total é chamado de conclusão. (p. 56).
- Se o
primeiro terreno desse discurso não forem as definições, ou se as definições
não forem corretamente ligadas em silogismos, nesse caso o fim ou conclusão
volta a ser opinião acerca da verdade de algo afirmado, embora as vezes
em palavras absurdas e destituída de sentido, sem possibilidades de serem
compreendidas. (p. 56).
-
[...] o testemunho da consciência tem sido sempre atendido com a maior
diligencia em todos os tempos. Depois passou-se a usar metaforicamente a mesma
palavra, indicando o conhecimento dos fatos secretos e pensamentos secretos de
cada um, sendo portanto metaforicamente que se diz que a consciência equivale a
mil testemunhas. (p. 56).
- [...]
os homens, veementemente apaixonados por suas opiniões por mais absurdas que
fossem, e obstinadamente decididos a mantê-las, deram também a essas opiniões o
reverenciado nome de consciência, como se pretendessem ilegítimo mudá-las ou
falar contra elas. Dessa forma pretendem saber que estão certos, quando no
máximo sabem que pensam estar. (p. 56).
- Na
crença há duas opiniões, uma relativa ao que a pessoa diz, e outra relativa à
sua virtude. Acreditar, ter fé em, ou confiar em alguém, tudo isso significa a
mesma coisa: a opinião da veracidade de uma pessoa. Acreditar no que é dito, significa
apenas uma opinião da verdade da coisa dita. (p. 57).
- No
Credo, “crer em” não significa confiar na pessoa e, sim, uma confissão e
aceitação da doutrina. (p. 57).
-
[...] quando acreditamos que qualquer espécie de afirmação é verdadeira, com
base em argumentos que não são tirados da própria coisa, nem dos princípios da
razão natural, mas são tirados da autoridade de quem fez essa afirmação, neste
caso o objeto de nossa fé é o orador ou a pessoa em quem acreditamos, ou em
quem confiamos e cuja palavra aceitamos; e a honra feita ao acreditar é feita
apenas a essa pessoa. Consequentemente, quando acreditamos que as Escrituras
são a palavra de Deus, sem ter recebido qualquer revelação imediata do próprio
Deus, o objeto de nossa crença, fé e confiança é a igreja, cuja palavra
aceitamos e à qual aquiescemos. (p. 57)
- Aqueles que acreditam naquilo que um
profeta lhes diz em nomes de Deus aceitam a palavra do profeta, honram-no e
nele confiam e crêem, aceitando a verdade do que ele diz, quer se trate de um
verdadeiro ou falso profeta. (p. 57).
-
[...] seja o que for que acreditarmos tendo como única razão para tal a que
deriva apenas da autoridade dos homens e de seus escritos, que eles tenham sido
ou não enviados por Deus, nossa fé será apenas fé nos homens. (p. 57-58).
Cap. 8
AS VIRTUDES CHAMADAS
INTELECTUAIS E OS DEFEITOS CONTRÁRIOS A ESTAS
Definição da virtude intelectual – O
talento, natural ou adquirido – O talento natural – O bom talento, ou
imaginação – O bom juízo – A descrição – A prudência – A habilidade – O talento
adquirido – A leviandade – A loucura – A raiva – A melancolia – A linguagem
insignificante.
- Se todas as coisas fossem iguais em
todos os homens nada seria apreciado. (p. 58).
- Por virtudes intelectuais sempre se
entende aquela capacidade do espírito que os homens elogiam, valorizam e
desejariam possuir em si mesmos. Vulgarmente recebem o nome de talento
natural, embora a mesma palavra talento também seja usada pra distinguir das
outras uma certa capacidade. (p. 58).
- São
de duas espécies essas virtudes: naturais e adquiridas. Por naturais não
entendo as que um homem possui de nascença, pois isso é apenas sensação, pela
qual os homens diferem tão pouco uns dos outros [...] Quero referir-me àquele
talento que se adquire apenas através da prática e da experiência, sem método,
cultura ou instrução. Este talento natural consiste principalmente em duas
coisas: celeridade – isto é, rapidez na passagem de um pensamento a outro e
firmeza de direção para um fim escolhido. (p. 58).
- Tal diferença de rapidez é causada pela
diferença das paixões dos homens, que gostam e detestam uns de uma coisa,
outros de outras. (p. 58).
-
Daqueles que observam suas diferenças e dissimilitudes, ao que se chama
distinguir, discernir e julgar entre coisas diversas, nos casos em que tal
discernimento não seja fácil, diz-se que têm um bom juízo. (p. 59).
- [...] a imaginação, quando não é
acompanhada de juízo, não se recomenda como virtude. [...] o juízo e descrição,
recomenda-se por si mesma, sem a ajuda da imaginação. (p. 59).
- Sem firmeza e direção para um fim
determinado, uma grande imaginação é um espécie de loucura [...] (p.
59).
- O
juízo deve ser predominante num bom livro de história, porque a excelência da
obra consiste no método e na verdade, assim como na escolha das ações que é
mais proveitoso conhecer. A imaginação não tem lugar aqui, a não ser para
ornamentar estilos. (p. 60).
- A
imaginação é predominante nas orações laudatórias e nas invectivas, porque o
objetivo não é a verdade, mas a honra ou a desonra, o que é feito mediante
nobres ou vis comparações. O juízo se
limita a sugerir quais as circunstâncias que tornam uma ação louvável ou
condenável. (p. 60).
- [...]
em toda busca rigorosa da verdade o juízo faz tudo. A não ser que por vezes o
entendimento tenha de ser ajudado por uma semelhança adequada, havendo nesse
caso um uso da imaginação. (p. 60).
-
Quanto às metáforas, nesse caso estão completamente excluídas. Sabendo que elas
abertamente professam a simulação, admiti-las no conselho e no raciocínio seria
manifesta loucura. (p. 60).
- Os secretos pensamentos de cada pessoa
percorrem todas as coisas, sagradas ou profanas, limpas ou obscenas, sérias ou
frívolas, sem vergonha ou censura. Coisa que o discurso verbal não pode fazer,
limitado pela aprovação do juízo quanto ao momento, ao lugar e à pessoa. (p. 60).
- É
na falta de discrição que reside a diferença. (p. 60).
- [...]
quando há falta de talento não é a imaginação que falta, mas a discrição. O
juízo sem imaginação é talento, mas a imaginação sem juízo não o é. (p.
61).
- Governar bem uma família ou um reino não
corresponde a diferentes graus de prudência, mas a diferentes espécies de
ocupação, do mesmo modo que desenhar
um quadro pequeno, grande ou em tamanho maior que o natural, não corresponde a
diferentes graus de arte. (p. 61).
-
Caso à prudência se apresentar o uso de meios injustos ou desonestos [...]
temos aquele perverso talento a que se chama astúcia. (p. 61).
- A
magnanimidade é o desprezo pelos expedientes injustos ou desonestos.
(p. 61).
-
Com relação ao talento adquirido – ou seja, adquirido por método e instrução –
o único que existe é a razão, que assenta no uso correto da linguagem, e da
qual derivam as ciências. (p. 61).
- Residem nas paixões as origens das
diferenças de talentos. A diferença das paixões deriva em parte da diferente
constituição do corpo e em parte das diferenças de educação. (p. 61).
- [...] paixões [...] são diferentes não
apenas por causa das diferenças de constituição dos homens, mas também por
causa das diferenças de costumes e educação entre estes. (p. 62).
- [...] a riqueza, o saber e a honra não
são mais do que diferentes formas de poder. (p. 62).
- Os
pensamentos são para os desejos como batedores, ou espias, que vão ao exterior
procurar o caminho para as coisas desejadas. É daí que provem toda a firmeza do
movimento do espírito, assim como toda a rapidez deste. [...] não ter nenhum desejo é o mesmo que está morto. Ter por qualquer coisa paixões mais fortes
e veementes do que geralmente se verifica nos outros é aquilo que os homens
chamam loucura. (p. 62).
- [...] o dano e indisposição dos órgãos
são causados pela veemência ou pelo extremo prolongamento da paixão.
(p. 62).
- Sobre a paixão, cuja violência ou
prolongamento provoca a loucura, é uma grande vanglória, a que vulgarmente se
chama orgulho ou auto-estima, e é um grande desalento do espírito. (p.
62).
- O que
torna os homens sujeitos à cólera é o orgulho, cujo excesso é a loucura chamada
raiva ou fúria. Dessa forma ocorre que o excessivo desejo de vingança, quando
se torna habitual, prejudica os órgãos e se transforma em raiva. O amor
excessivo, junto ao ciúme, também se transforma em raiva. (p. 62).
- A veemente convicção da verdade de
alguma coisa, quando contrariada pelos outros, também se transforma em raiva.
(p. 63).
- O que
provoca no homem receios infundado é o abatimento, que constitui uma loucura
vulgarmente chamada melancolia, a qual se manifesta em diversas condutas:
visita a cemitérios e lugares solitários, atos de superstição e medo de alguém
ou de alguma coisa determinada. Resumindo, todas as paixões que provocam
comportamentos estranhos e invulgar são designadas pelo nome de loucura. (p. 63).
- Se
os excessos são loucuras, não resta dúvida de que as próprias paixões, quando tendem para o mal, constituem outros
tantos graus de desequilíbrio. (p. 63).
- [...] a loucura não é mais do que o
excesso de manifestação da paixão
[...]. A variedade da conduta dos homens que bebem demais é a mesma que
a dos loucos, uns enraivecendo-se, outros amando, outros rindo, tudo isso de
maneira extravagante, mas conformemente às varias paixões dominantes. (p. 64).
- As escrituras foram escritas para
mostras aos homens o reino de Deus e preparar seus espíritos para se tornarem
seus súditos obedientes, deixando o mundo e a filosofia a ele referente
às disputas dos homens, pelo exercício de sua razão natural. (p. 66).
- Por espíritos sempre se entendem coisas
que, sendo incorpóreas, podem, contudo, ser movidas de um lugar a outro.
(p. 68).
CAP.
9
SOBRE OS DIFERENTES
OBJETOS OS CONHECIMENTO
- Há dois gêneros de conhecimento. Um dos
quais é um conhecimento dos fatos, o outro o conhecimento das consequências de
uma afirmação para outra. (p. 68).
- O primeiro está limitado aos sentidos e
à memória. É um conhecimento absoluto [...]. Este é o conhecimento necessário a
uma testemunha. (p. 68).
- Ao segundo chama-se ciência. É
condicional, como quando sabemos que se a figura apresentada for um círculo,
nesse caso qualquer linha reta que passe por seu centro dividi-la-á em duas
partes iguais. Este é o conhecimento necessário para um filósofo. Isto é, para
aquele que pretende raciocinar. (p. 68).
- Chama-se história o registro do
conhecimento dos fatos. Da
história há duas espécies: uma chamada história natural, que é a
história daqueles fatos, ou efeitos da natureza, que não dependem da vontade
dos homens. Assim são as histórias dos metais, plantas, animais, regiões e
assim por diante. (p.68).
- A outra é a história civil, que é a
história das ações voluntárias praticadas pelos homens nos Estados.
(p.68).
- A
ciência registra seus apontamentos naqueles livros que encerram demonstrações
das consequências de uma afirmação para outra e são popularmente chamados
livros de filosofia. (p.68).
CAP. 10
SOBRE O PODER, VALOR,
DIGNIDADE, HONRA E MERECIMENTO
Do poder, valor, dignidade, honra e
merecimento – O poder – O valor – A dignidade – Honrar e desonrar- Honroso –
Desonroso – Os escudos – Os títulos de honra – O merecimento – A aptidão
- Universalmente considerado, o poder de
um homem consiste nos meios de que presentemente dispõe para obter qualquer
visível bem futuro. Pode ser
original ou instrumental. (p. 70).
- Poder natural é a eminência das
faculdades do corpo ou do espírito. Extraordinária força,
beleza, prudência, capacidade, eloqüência, liberalidade ou nobreza. Os poderes
instrumentais são os que se adquire mediante os anteriores ou pelo acaso e
constituem meios e instrumentos para se adquirir mais. Como exemplo, a riqueza,
a reputação, os amigos e os secretos desígnios de Deus a que os homens chamam
boa sorte. A natureza do poder é
nesse ponto idêntica à da fama, dado que cresce à medida que progride.
(p. 70).
- Dos poderes humanos o maior é aquele que
é composto pelos poderes de vários homens, unidos por consentimento numa só
pessoa, natural ou civil, que tem o uso de todos os seus poderes na dependência
de sua vontade. É o caso do poder de um Estado. Na dependência da
vontade de cada indivíduo, é o caso do poder de uma facção, ou várias facções
coligadas. (p. 70).
- A
riqueza aliada à liberdade também é poder, porque consegue amigos e servidores.
Privada de liberdade, não o é, porque nesse caso a riqueza não protege, mas
expõe o homem, como presa, à inveja. (p. 70).
- [...] qualquer qualidade que torna um
homem amado ou temido por muitos, é poder. Isso porque constitui um
meio para adquirir a ajuda e serviço de muitos. (p. 70).
-
Constitui poder a nobreza, não em todos os lugares, mas somente naqueles
Estados onde goza de privilégios, pois é nesses privilégios que reside seu
poder. (p. 71).
- É da natureza da ciência que só podem
compreendê-la aqueles que em boa medida já alcançaram. (p. 71).
- O valor de um homem, tal como o de todas
as outras coisas, é seu preço. (p. 71).
- Um
hábil condutor de soldados é de alto preço em tempo de guerra presente ou
iminente, mas não o é em tempo de paz. Um juiz douto e incorruptível é de alto
valor em tempo de paz, mas não o é em tempo de guerra. (p. 71).
-
Atribuir a um homem um alto valor é honrá-lo e um baixo valor é desonrá-lo. (p.
71).
- O valor público de um homem, aquele que
lhe é atribuído pelo Estado, é o que os homens geralmente chamam dignidade.
Esta sua avaliação pelo Estado se exprime por meio de cargos de direção, funções
judiciais e empregos públicos ou pelos nomes e títulos introduzidos para a
distinção de tal valor. (p. 71-72).
-
Elogiar outra pessoa, por qualquer tipo de ajuda, é honrar, porque é sinal de
que em nossa opinião ela tem poder para auxiliar. Quanto mais difícil é a
ajuda, maior é a honra. (p. 72).
-
Ceder o passo ou o lugar a outrem, em qualquer questão, é honrar, porque
equivale a admitir um poder superior. Fazer frente é desonrar. (p. 72).
- Pedir a um homem seu conselho, ou um
discurso de qualquer tipo, é honrar, em sinal de que o consideramos sábio,
eloqüente ou sagaz. Dormir, afastar-se, ou falar quando ele fala é desonrá-lo.
(p. 72).
-
Pedir orientação ou colaboração em ações difíceis é honrar, como sina de apreço
pela sabedoria ou outro poder. Recusar a colaboração dos que a oferecem é
desonrar. (p. 73).
-
[...] a fonte de toda honra civil reside
na pessoa do Estado e depende da vontade do soberano. Conseguintemente, é
temporária e chama-se honra civil. (p. 73).
- [...]
ser honrado, amado ou temido por muitos é honroso e prova de poder. (p.
73).
- São
honrosos o domínio e a vitória, porque se adquire pelo poder. A servidão, que
vem da necessidade ou do medo, é desonrosa. (p. 73).
-
Ser ilustre, quer dizer, ser conhecido pela riqueza, cargos, grandes ações ou
qualquer bem iminente, é honroso, como sinal do poder que faz alguém ser
ilustre. O contrário, a obscuridade, é desonrosa. (p. 74).
- Os
antigos comandantes gregos, quando iam para a guerra, mandavam pintar em seus
escudos as divisas que lhes aprazia, sendo um escudo sem emblema um sinal de
pobreza, próprio do soldado comum. (p. 75).
- Títulos
de honra, como duque, conde, marquês e barão são honrosos, pois significam o
valor que lhes é atribuído pelo poder soberano do Estado. Nos tempos
antigos esses títulos correspondiam a cargos e funções de mando, sendo alguns
derivados dos romanos e outros dos germanos e franceses. Os duques, em latim, duces, eram generais de guerra. Os condes,
comites, eram os companheiros ou amigos do general, e era-lhes confiado o
governo e a defesa dos lugares de conquistados e pacificados. O marquês,
marchiones, eram condes que governavam as marcas ou fronteiras do império. Esses títulos de duque, conde e marquês foram introduzidos no império,
na época de Constantino, o Grande, numa adaptação dos costumes da milícia dos
germanos. Barão parece ter sido um titulo dos
gatileses, e significa um grande homem, como os guardas que os reis e príncipes
usavam na guerra para rodear sua pessoa. O termo parece derivar de vir, para ber e bar, que na língua
dos gauleses significava o mesmo que vir em latim. Daí para bero e baro. Assim esses homens eram chamados berones, e posteriormente barones,
e em espanhol varones. [...] com o
passar do tempo estes cargos de honra [...] foram transformados em meros
títulos, servindo em sua maioria para distinguir a preeminência, lugar e ordem
dos súditos no Estado, e foram nomeados duques, condes, marqueses e barões para
lugares dos quais essas pessoas não tinham posse nem comando. (p. 76-77).
- Coisa
diferente de seu valor é o merecimento de um homem, e também de seu mérito.
(p. 77).
- O
mérito pressupõe um direito. A coisa merecida é devida por promessa.
(p. 77).
Cap. 11
SOBRE AS DIFERENÇAS
DE COSTUMES
O que aqui se entende por costumes – Um
irrequieto desejo de poder, em todos os homens – O gosto pela disputa derivado
do gosto pela competição – A obediência civil derivada do gosto pelo conforto –
Derivada do medo da morte ou dos ferimentos – E do amor às artes – O amor à
virtude derivado do amor à lisonja – O ódio derivado da dificuldade de obter
grandes benefícios – E da consciência de merecer ser odiado – A tendência para
ferir derivada do medo – E da desconfiança no próprio talento – Os
empreendimentos vãos derivados da vanglória – A ambição derivada da opinião de
suficiência – A irresolução derivada do exagero da importância das pequenas
coisas – A confiança nos outros derivada da ignorância dos sinais da sabedoria
e da bondade – E da ignorância das causas naturais – E da falta de entendimento
– A aceitação dos costumes derivada da ignorância da natureza do bem e do mal –
A aceitação dos indivíduos derivada da ignorância das causas da paz – A
credulidade derivada da ignorância da natureza – A curiosidade de saber
derivada da preocupação com o tempo futuro – Sua religião natural.
- [...] a felicidade desta vida não
consiste no repouso de um espírito satisfeito. (p. 78).
- Ao homem é impossível viver quando seu
desejo chega ao fim, tal como quando seus sentidos e imaginação ficam
paralisados. (p. 78).
- A felicidade é um contínuo progresso do
desejo, de um objeto para outro, não sendo a obtenção do primeiro outra coisa
senão o caminho para conseguir o segundo. Sendo a causa disso que o objeto do
desejo do homem não é gozar apenas uma vez, e só por um momento, mas garantir
para sempre os caminhos de seu desejo futuro. (p. 78).
- [...] assinalo como tendência geral de
todos os homens um perpétuo e irrequieto desejo de poder e mais poder, que
cessa apenas com a morte. A causa disso nem sempre é que se espere um
prazer mais intenso do que aquele que já se alcançou [...] mas o fato de não se
poder garantir o poder e os meios para viver bem. Daqui se segue que os reis, cujo poder é maior, se esforçam
por garanti-lo no interior por intermédio de leis, e no exterior por meio de
guerras. (p. 78).
- A
disputa pela riqueza, a honra, o mando e outros poderes leva à luta, à
inimizade e à guerra, porque o caminho seguido pelo competidor para realizar
seu desejo consiste em matar, subjugar, suplantar ou repelir o outro. (p.
78-79).
- Deleite sensual e desejo de conforto
predispõem os homens para a obediência ao poder comum, pois com tais desejos se
abandona a proteção que se poderia esperar do esforço e trabalho próprios.
O medo da morte e dos ferimentos produz a mesma tendência e pela mesma razão.
(p. 79).
-
[...] os homens necessitados e esforçados, que não estão contentes com sua
presente condição, [...] têm tendência para provocar situações belicosa e para
causar perturbações e revoltas. (p.79)
- [...] tudo o que constitui prazer para
os sentidos constitui também para a imaginação. (p. 79).
-
Faz tender para o amor fingido receber de alguém a quem consideramos nosso
igual maiores benefícios do que esperávamos. Na realidade, faz tender para o
ódio secreto, pois nos coloca na situação de devedor desesperado que, ao
recusar-se ao ver seu credor, tacitamente deseja que ele se encontre onde
jamais possa voltar a vê-lo. Os
benefícios obrigam, e a obrigação é servidão. (p. 79).
- A obrigação que não se pode compensar é servidão
perpétua. (p. 79).
-
Nos tumultos e sedições, os homens que desconfiam de sua própria sutileza se
encontram mais predispostos para a vitória do que os que se consideram sábios
ou sagazes, pois estes últimos gostam de se informar primeiro e os outros com
medo de ser ultrapassados gostam de atacar primeiro. (p. 80).
- Os
homens vaidosos, que sem ter consciência de grande capacidade se deliciam em
julgar-se valentes, tendem apenas para a ostentação, não para os atos, pois
quando surgem perigos ou dificuldades só os aflige ver descoberta sua
incapacidade. (p. 80).
- Os homens que têm em alta sua sabedoria
em questões de governo têm tendência para a ambição. (p. 80).
-
Embora nos pobres seja uma virtude, a frugalidade torna os homens incapazes de
levar a cabo as ações que necessitam da força de muitos homens ao mesmo tempo.
Pois enfraquece seu esforço, que deve ser alimentado e revigorado pela
recompensa. (p. 81).
- A ausência de ciência, em outras
palavras, a ignorância das causas, predispõe, ou melhor, obriga os homens a
confiar na opinião e autoridade alheia. Todos os homens
preocupados com a verdade, se não confiarem em sua própria opinião, deverão
confiar na de alguma outra pessoa, a quem considerarem mais sabia que eles
próprios, e não considerem provável que queira enganá-los. (p. 81).
- O
desconhecimento do significado das palavras, isto é, a falta de entendimento,
predispõe os homens para confiar, não apenas na verdade que não conhecem, mas
também nos erros e, mais importante, nos absurdos daqueles em quem confiam. Nem o erro nem o absurdo podem ser
detectados sem um perfeito entendimento das palavras.
(p. 81).
-
[...] em todos os lugares onde os homens se vêem sobrecarregados com tributos
fiscais, descarregam sua fúria em cima dos publicanos, quer dizer, os
recebedores fiscais e outros funcionários da renda pública, e se associam
àqueles que censuram o governo civil. (p. 82-83).
- [...]
a ignorância das causas naturais predispõe os homens para a credulidade,
fazendo-os inúmeras vezes acreditar em coisas impossíveis. [...] a
credulidade predispõe-nos para mentir. [...] a simples ignorância sem ser
acompanhada de malícia é capaz de levar os homens tanto para acreditar em
mentiras como a dizê-las. A inventá-las também. (p. 83).
- O que predispõe os homens para
investigar as causas das coisas é a ansiedade em relação ao futuro, já que esse conhecimento torna os homens
mais capazes de dispor o presente da maneira mais vantajosa. (p. 83).
- O
amor pelo conhecimento das causas [...] afasta o homem da contemplação do
efeito para a busca da causa, e depois também da causa dessa causa, até que
forcosamente se deva chegar a essa idéia: de que há uma causa da qual não há
causa anterior, porque é eterna. É aquilo a que os homens chama Deus. De modo
que é impossível proceder a qualquer investigação profunda das causas naturais,
sem com isso nos inclinar para acreditar que existe um Deus eterno, embora não
possamos ter em nosso espírito uma idéia dele que corresponda à sua natureza.
(p. 83).
- [...] por meio das coisas visíveis deste
mundo, e de sua ordem admirável, se pode conceber que há uma causa dessas
coisas, a que os homens chamam Deus, mas sem ter uma imagem ou idéia dele no
espírito. (p. 83).
-
Aqueles que pouca ou nenhuma investigação fazem das causas naturais das coisas
[...] tendem a supor e a imaginar por eles mesmos várias espécies de poderes
invisíveis, e a se encher de admiração e respeito por suas próprias fantasias.
Em épocas de desgraça tendem a invocá-las. Quando esperam um bom sucesso tendem
a agradecer-lhes, transformando em seus deuses as criaturas de sua própria
fantasia. Foi dessa maneira que aconteceu, devido a infinita variedade de
fantasias, terem os homens criados no mundo inúmeras espécies de deuses. Esse medo das coisas invisíveis é a
semente natural daquilo a que se chama religião. Esse medo, naqueles que veneram e temem esse poder de maneira
diferente da sua, se chama superstição. (p. 83-84).
Cap. 12
SOBRE A RELIGIÃO
A religião, só no homem – Primeiro, a
partir de seu desejo de conhecer as causas – A partir da consideração do início
das coisas – A partir de sua observação das sequelas das coisas – A causa
natural da religião: a ansiedade quanto aos tempos vindouros – O que os faz
temer o poder das coisas invisíveis – E supô-las incorpóreas – Mas sem conhecer
a maneira como elas afetam alguma coisa – Mas venerá-las tal como veneram os
homens – E atribuir-lhes toda espécie de acontecimentos extraordinários –
Quatro coisas, as sementes naturais da religião – Tornadas diferentes pelo
cultivo – A absurda opinião do gentilismo – Os desígnios dos autores da
religião dos pagãos – A verdadeira religião, o mesmo que as leis do reino de
Deus – As causas de mudança na religião – A imposição de crenças impossíveis –
Agir contrariamente à religião que estabelecem – Falta de testemunho dos
milagres
- Observando que só no homem encontramos
sinais ou frutos da religião, não há motivo para duvidar de que a semente da
religião se encontra apenas no homem [...]. (p. 84).
- [...] é peculiar à natureza do homem investigar
as causas dos eventos que assiste [...]. (p. 84).
-
É-lhe também peculiar, em segundo lugar, perante toda e qualquer coisa que
tenha sido um começo, pensar que ela teve também uma causa, que determinou esse
começo no momento em que o fez, nem mais cedo nem mais tarde. (p. 85).
- Em
terceiro lugar, para os animais, pois, a única felicidade é o gozo de
sues alimentos, repouso e prazeres cotidianos, já que de pouca ou nenhuma previsão dos tempos futuros são capazes,
por ausência de observação e de memória da ordem, consequencia e dependência
das coisas que vêem. (p. 85).
- [...] todos os homens, sobretudo, os que
são extremamente previdentes, se encontram numa situação semelhante à de
Prometeu. Tal como Prometeu – nome que quer dizer homem prudente – foi
acorrentado ao monte Cáucaso [...] onde uma águia se alimentava de seu fígado,
devorando de dia o que tinha voltado a crescer durante à noite, assim também o
homem que olha demasiado longe, preocupado com os tempos futuros, tem durante
todo o dia seu coração ameaçado pelo medo da morte, da pobreza ou de outras
calamidades, e não encontra repouso nem paz para a sua ansiedade a não ser no
sono. (p. 85).
-
[...] o reconhecimento de um único Deus eterno, infinito e onipotente pode ser
derivado do desejo que os homens sentem de conhecer as causas dos corpos
naturais e suas diversas virtudes e operações. (p. 86).
- [...] os homens que, através de sua
própria meditação, acabam por reconhecer um Deus infinito, onipotente e eterno,
preferem antes confessar que ele é incompreensível e se encontra acima do seu
entendimento, em vez de definir sua natureza pelas palavras “espírito
incorpóreo”, para depois confessar que sua opinião é ininteligível. (p.
86).
- É nestas quatro coisas, a crença nos
fantasmas, a ignorância das causas segundas, a devoção pelo que se teme e
aceitação de coisas acidentais como prognósticos, que consiste a semente
natural da religião. (p. 88).
-
Estas sementes foram cultivadas por duas espécies de homens. Uma foi a daqueles
que as alimentaram e ordenaram segundo sua própria invenção. A outra foi a dos
que o fizeram sob o mando e direção de Deus. (p. 88).
-
[...] a religião da primeira espécie constitui parte da política humana, e
ensina parte do dever que os reis terrenos exigem de seus súditos. A religião
da segunda espécie é a política divina, que encerra preceitos para aqueles que
se erigiram como súditos do reino de Deus. Da primeira espécie são todos os
fundadores de Estados e legisladores dos gentios. Da segunda espécie são
Abraão, Moisés e nosso abençoado salvador, dos quais chegaram até nós as leis
do reino de Deus. (p. 88).
- Um deus com o nome de Caos simbolizava a
matéria informe do mundo. (p.
88).
-
Tão fácil é os homens serem levados a acreditar em qualquer coisa por aqueles
que gozam de crédito junto deles [...]. (p. 91).
- Os primeiros fundadores e legisladores
de Estados entre os gentios, portanto, cujo objetivo era apenas manter o povo
em obediência e paz, em todos os lugares tiveram os seguintes cuidados.
(p. 91).
- Primeiro, o de incutir em suas mentes a
crença de que os preceitos que ditavam a respeito da religião não deviam ser
considerados como provenientes de sua própria invenção, mas como ditames de
algum deus [...] a fim de que suas leis fossem mais facilmente aceitas.
(p. 91).
- Em segundo lugar, tiveram o cuidado de
fazer acreditar que aos deuses desagradavam as mesmas coisas que eram proibidas
pelas leis. (p. 91).
- Em terceiro lugar, o de prescrever
cerimônias, suplicações, sacrifícios e festivais, os quais se devia acreditar
capazes de aplacar a ira dos deuses. Como da ira dos deuses resultava o
insucesso na guerra, grandes doenças contagiosas, terremotos e a desgraça de
cada indivíduo. Essa ira provinha da falta de cuidado com sua veneração e do
esquecimento ou do equívoco em qualquer aspecto das cerimônias exigidas. (p.
91).
- Quando
foi o próprio Deus, através da revelação sobrenatural, que implantou a
religião, nesse momento ele estabeleceu também para si mesmo um reino
particular, e não ditou apenas leis relativas ao comportamento para consigo
próprio, mas também de uns para com os outros. (p. 92).
-
[...] no reino de Deus, a política e as leis civis fazem parte da religião, não
tendo, portanto, lugar a distinção entre a dominação temporal e a espiritual.
(p. 92).
- Deus é rei de toda a terra por seu
poder, mas de seu povo escolhido é rei em virtude de um pacto. (p. 92).
- [...] toda religião estabelecida assenta
inicialmente na fé de uma multidão em determinada pessoa, que se acredita não
apenas ser um sábio, e esforçar-se por conseguir a felicidade de todos, mas
também ser um santo, a quem o próprio Deus decidiu declarar sobrenaturalmente
sua vontade [...]. (p. 92-93).
- O que
faz perder a fama de sabedoria, naquele que estabelece uma religião, ou lhe
acrescenta algo depois de já estabelecida, é a imposição de crenças
contraditórias. (p. 93).
- O que
faz perder a reputação de sinceridade é fazer ou dizer coisas que pareçam ser
sinais de que não se acredita nas coisas em que se exige que os outros
acreditem. (p. 93).
-
[...] o que faz perder a reputação de amor é deixar transparecer ambições
pessoas, quando a crença que se exige dos outros conduz ou parece conduzir à
aquisição de domínio, riquezas, dignidade, ou à garantia de prazeres, apenas ou
especialmente para si próprio. (p. 93).
Cap. 13
SOBRE A CONDIÇÃO
NATURAL DA HUMANIDADE RELATIVAMENTE À SUA FELICIDADE E MISÉRIA
Os homens iguais por natureza – Da
igualdade deriva a desconfiança – Da desconfiança, a guerra – Fora dos Estados
civis, há sempre guerra de todos contra todos – Os inconvenientes de uma tal
guerra – Numa tal guerra, nada é injusto – As paixões que levam os homens a
tender para a paz
-
Observa-se que a natureza fez os homens tão iguais, no que se refere às
faculdades do corpo e do espírito que, embora por vezes se encontre um homem
visivelmente mais forte de corpo, ou de espírito mais vivo do que outro, quando
se considera tudo isso em conjunto, a diferença entre um e outro homem não é
suficientemente considerável para que outro não possa com razão nela reclamar
qualquer benefício a que outro não possa também aspirar, tal como ele. (p. 96).
- Quanto à força corporal, o mais fraco
tem força suficiente para matar o mais forte, quer por secreta maquinação, quer
aliando-se com outros que se encontrem ameaçados pelo mesmo perigo. (p.
96).
- No
que se refere às faculdades do espírito [...], encontro entre os homens uma
igualdade ainda maior que a igualdade de força. (p. 96).
- A
prudência nada mais é do que experiência, que um tempo igual oferece a todos os
homens equitativamente, naquelas coisas a que igualmente se dedicam.
(p. 96).
- O que aparentemente possa tornar
inaceitável essa igualdade é simplesmente a concepção vaidosa da própria
sabedoria, a qual quase todos os homens supõem possuir em maior grau que o
vulgo. (p. 96).
- A
natureza dos homens é tal que, embora sejam capazes de reconhecer em muitos
outros maior inteligência, maior eloqüência ou maior saber, dificilmente
acreditam que haja muitos tão sábios como eles próprios. (p. 96).
- Em
geral não há sinal mais claro de uma distribuição equitativa de alguma coisa do
que o fato de todos estarem contentes com a parte que lhes coube. Desta
igualdade quanto a capacidade deriva a igualdade quanto à esperança de
atingirmos nossos fins. (p. 96).
- Se dois homens desejam a mesma coisa,
portanto, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por ambos, eles se
tornam inimigos. No caminho para seu fim que – que é principalmente sua própria
conservação e às vezes apenas seu deleite –, esforçam-se por destruir ou
subjugar um ao outro. (p. 96-97).
- Contra esta desconfiança de uns em
relação aos outros, nenhuma maneira de se garantir é tão razoável como a
antecipação. (p. 97).
- Esse
aumento de domínio sobre os homens, sendo necessário para a conservação de cada
um, deve ser por todos, admitido, obviamente. (p. 97).
- [...] os homens não tiram prazer algum
da companhia uns dos outros – e sim desprazer –, quando não existe um poder
capaz de manter a todos em respeito,
pois cada um pretende que seu companheiro lhe atribua o mesmo valor que ele se
atribui a si próprio, e na presença de todos os sinais de desprezo ou de
subestimação, naturalmente se esforça, na medida em que a tal se atreva [...],
por arrancar de seus contendores a atribuição de maior valor, causando-lhes
dano e, pelo exemplo, expandindo o dano aos demais. (p. 97).
- Na natureza do homem encontramos três
causas principais de discórdia. Primeiro, a competição; segundo, desconfiança;
e terceiro, a vanglória. (p. 97).
- A primeira leva os homens a atacar os
outros visando lucro. A segunda, a segurança. A terceira, a reputação. Os primeiros praticam a violência para se
tornar senhores das pessoas, mulheres, filhos e rebanhos dos domínios. Os
segundos, para defendê-los. Os terceiros por ninharias, como uma palavra, um
sorriso, uma diferença de opinião e qualquer outro sinal de desprezo, quer seja
diretamente endereçado a sua pessoa, quer indiretamente a seus parentes,
amigos, nação, profissão ou seu nome. (p. 97-98).
- [...] durante o tempo em que os homens
vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se
encontram naquela situação a que se chama guerra. Uma guerra que é de todos os
homens contra todos os homens. A guerra não consiste apenas na batalha,
ou no ato de lutar, mas naquele lapso de tempo durante o qual a vontade de
travar batalha é suficientemente conhecida. Daí a noção de tempo deve ser levada em conta quanto a natureza da
guerra, do mesmo modo que quanto a natureza do clima. Tal como a natureza do
mal tempo não consiste em dois ou três chuviscos, mas numa tendência para
chover que pode durar vários dias seguidos, também a natureza da guerra não
consiste na luta real, mas na conhecida disposição para tal [...]. (p.
98).
- Os desejos e outras paixões dos homens
não são em si mesmos um pecado. Nem tampouco o são as ações que derivam dessas
paixões, até o momento em que se tome conhecimento de uma lei que as proíba, o
que será impossível até o momento em que sejam feitas as leis. Nenhuma lei pode
ser feita antes de se determinar qual pessoa irá fazê-la. (p. 99).
- Da guerra de todos contra todos, também
isto é consequencia: que nada poder ser injusto. As noções do bem e do mal, de
justiça e injustiça, não podem ter lugar ai. Onde não há poder comum não há
lei. Onde não há lei não há injustiça. Na guerra, a força e a fraude são
as duas virtudes principais. A
justiça e a injustiça não fazem parte das faculdades do corpo ou do espírito.
[...]. São qualidades que pertencem aos homens em sociedade, não na solidão.
Outra consequência da mesma condição é que não há propriedade, domínio,
distinção entre o meu e o teu. Pertence
a cada um só aquilo que ele é capaz de conseguir, e apenas enquanto for capaz
de conservá-lo. É esta a miserável condição em que o homem realmente se
encontra, por obra da simples natureza. (p. 99-100).
- As paixões que levam os homens preferir
a paz são o medo da morte, o desejo daquelas coisas que são necessárias para
uma vida confortável e a esperança de consegui-las por meio do trabalho. (p. 100).
- A razão sugere adequadas normas de paz,
em torno das quais os homens podem chegar a acordos. Essas normas são aquelas a
que por outro turno se chama leis da natureza. (p. 100).
Cap. 14
SOBRE A PRIMEIRA E A
SEGUNDA LEIS NATURAIS E SOBRE OS CONTRATOS
O que é direito de natureza – O que é a liberdade –
O que é uma lei de natureza – Diferença entre lei e direito – Naturalmente,
todo homem tem direito a tudo – a lei fundamental de natureza – A segunda lei
de natureza – O que é abandonar um direito – O que é renunciar a um direito – O
que é transferi o direito – A obrigação – O dever – A injustiça – Nem todos os
direitos são alienáveis – O que é um contrato – O que é um pacto – A doação –
Sinais expressos de contrato – Sinais de contrato por inferência – A doação
feita através de palavras do presente ou do passado – Os sinais do contrato são
palavras tanto do passado e do presente como do futuro – O que é o mérito – Os
pactos de confiança mútua: quando são inválidos – O direito aos fins contém o
direito aos meios – Não há pactos com os animais – Nem com Deus sem revelação
especial – Só há pacto a respeito do possível e do futuro – Como os pactos se
tornam nulos – Os pactos extorquidos pelo medo são validos – O pacto anterior
toma nulo o pacto posterior feito com outros – O pacto no sentido de alguém não
se defender é nulo – Ninguém pode ser obrigado a acusar-se a si mesmo – A
finalidade do juramento – A forma do juramento – Só a Deus se faz juramento – o
juramento nada acrescenta à obrigação
- O direito natural [...] é a liberdade que
cada um possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a
preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida.
Consequentemente de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe
indiquem como meio adequado a esse fim. (p. 101).
- [...] por liberdade entende-se a ausência
de impedimentos externos, que muitas vezes tiram parte do poder que cada um tem
de fazer o que quer, mas não podem proibir a que use o poder que lhe
resta, conforme o que seu julgamento e razão lhe ditarem. (p. 101)
- Lei natural, lex naturalis, é um
preceito ou regra geral, estabelecido pela razão, mediante o qual se proíbe a
um homem fazer tudo o que possa destruir a sua vida, privá-lo dos meios
necessário para preservá-la ou omitir aquilo que pense poder contribuir melhor
para preservá-la. (p. 101).
- [...] o direito consiste na liberdade de
fazer ou omitir, ao passo que a lei determina ou obriga a uma dessas duas
coisas. (p. 101).
- em tal condição (guerra) todo o homem tem direito
a todas as coisas, incluindo os corpos dos outros. Ora, enquanto perdurar
esse direito de cada homem a todas as coisas, não poderá haver para nenhum
homem [...] a segurança de viver todo tempo que geralmente a natureza permite
aos homens viver. (p. 101).
- É
um preceito ou regra geral da razão, que todo homem deve se esforçar pela paz,
na medida em que tenha esperança de consegui-la. Se não conseguir, pode
procurar e usar toda a ajuda e vantagens da guerra. A primeira
parte desta regra encerra a primeira e fundamental lei de natureza, que é
procurar a paz, e segui-la. A segunda resume o direto natural, isto é, por
todos os meios possíveis, cuidar da própria defesa. (p. 101).
- Desta lei fundamental de natureza, que
ordena a todos os homens que procurem a paz, deriva esta segunda lei: que um
homem concorde, conjuntamente com outros, e na medida em que tal considere
necessário para a paz e para a defesa de si mesmo, em renunciar a seu direito a
todas as coisas, contentando-se, em relação aos outros homens, com a mesma
liberdade que aos outros permite em relação a si mesmo. Pois enquanto cada homem detiver seu direito
de fazer tudo quanto queira, a condição de guerra será constante para todos.
Porém se os outros homens não renunciarem a seu direito, assim como ele
próprio, nesse caso não há razão par que alguém se prive do seu, pois isso
equivaleria a oferecer-se como presa – coisa a que ninguém é obrigado –, e a
não se dispor para a paz. (p. 102).
- Renunciar
ao direito a alguma coisa equivale a privar-se da liberdade de negar ao outro o
beneficio de seu próprio direito à mesma coisa. Quem abandona ou
renuncia a seu direito não dá a qualquer outra pessoa um direito que esta já
não tivesse antes, porque não há nada a que alguém não tenha direito por
natureza. (p. 102).
- Desiste-se de um direito apenas renunciado
a ele ou transferindo-o a para outrem. Renunciando simplesmente,
quando não importa em favor de quem irá redundar o respectivo beneficio.
Transferindo-o, quando com isso se pretende beneficiar uma determinada pessoa
ou varias pessoas. (p. 102).
- O jeito pelo qual um homem simplesmente renuncia,
ou transfere seu direito, é uma declaração ou expressão, mediante um sinal ou
sinais voluntários e suficientes, de que assim renuncia ou transfere, ou de que
assim renunciou ou transferiu o direito àquele que o aceitou. (p. 103).
- [...] nada se rompe mais facilmente do que
a palavra de um homem. (p. 103).
- O
objetivo de todos os atos voluntários dos homens é algum bem para si mesmo.
(p. 103).
- [...]
há alguns direitos que é impossível admitir que algum homem, por quaisquer
palavras ou outros sinais, possa abandonar ou transferir. Primeiramente,
ninguém pode renunciar ao direito de defesa a quem o ataca com violência para
tirar-lhe a vida [...]. (p. 103).
- Contrato é a transferência mútua de
direitos. (p. 103).
- [...] um dos contratantes pode entregar a coisa
contratada, permitido que o outro cumpra a sua parte num momento posterior
determinado, confiando nele até lá. Dessa forma, o contrato se chama pacto ou
convenção. Ambas as partes podem também contratar imediatamente para cumprir
mais tarde. Nesse caso, dado que se confia naquele que deverá cumprir sua
parte, a ação se chama observância da promessa ou fé. A falta de cumprimento –
se for voluntária – chama-se violação de fé. (p. 104).
- No caso da transferência de direito não ser
mútua, e uma das partes transferir na esperança de assim conquistar a amizade
ou os serviços de um outro ou dos amigos deste [...], nesse caso não há
contrato, mas doação,dádiva ou graça [...]. (p. 104).
- Os
sinais de contrato podem ser expressos ou por inferência. Expressas são as
palavras grafadas com a exatidão do que significam. Tais palavras
são do tempo presente ou do tempo passado. (p. 104).
- Os
Sinais por inferência são, na maioria das vezes, consequencia de palavras e,
outras vezes, consequencia do silêncio; por vezes consequencia de ações e, às
vezes, consequencia da omissão de ações. Normalmente um
sinal por inferência, de qualquer contrato, é tudo aquilo que demonstra de
maneira suficiente a vontade do contratante. (p. 104).
- [...] entre “Quero que isto seja teu
amanhã” e “Dar-te-ei isto amanhã”. A primeira maneira de falar indica um ato da
vontade presente, ao passo que a segunda indica um ato da vontade futura. A
primeira frase, estando no presente, transfere um direito futuro, e a segunda,
que é do futuro, não transfere nada. (p. 105).
- Em contratos, o direito não é transmitido
apenas quando as palavras são do tempo presente ou passado, mas principalmente
quando são do futuro, porque todo contrato é uma translação ou troca mútua
de direitos. (p. 105).
- [...] no contrato eu mereço em virtude do
meu próprio poder e da necessidade do contratante. (p. 105).
- No caso da doação o que me permite merecer
é apenas a benevolência do doador. (p. 105).
- No contrato mereço do contratante que ele
se desfaça do seu direito. Na doação não mereço que o doador se desfaça do seu
direito, e sim que, ao se desfazer dele, seja ele meu e não de outrem.
(p. 105).
- Ao se
fazer um pacto em que ninguém cumpre imediatamente sua parte e uns confiam nos
outros [...] a menor suspeita possível torna nulo esse pacto. Se houver,
entretanto, um poder comum situado acima dos contratantes, com direito e força
suficiente para impor seu cumprimento, ele não é nulo. Aquele que
cumpre primeiro não tem qualquer garantia de que o outro também cumprirá
depois, porque os vínculos das palavras são demasiado fracos para refrear a
ambição, a avareza, a cólera e outras paixões dos homens, caso não haja o medo
de algum poder coercitivo. (p. 106).
- Num Estado civil, que tem estabelecido um
poder para coagir aqueles que de outra maneira violarem sua fé, esse temor
deixa de ser razoável. Aquele que segundo o pacto deve cumprir primeiro é
obrigado a fazê-lo. (p. 106).
- A razão do medo que invalida um pacto deve
ser sempre algo que surja depois de feito o tal pacto. (p. 106).
- o que não pode impedir um homem de prometer
não deve ser admitido como impedimento do cumprimento. (p. 106).
- O que transfere qualquer direito transfere
também os meios de gozá-lo, na medida em que tal esteja em seu poder.
(p. 107).
- Sem mútua aceitação não há pacto possível.
(p. 107).
- Fazer votos com Deus é impossível, a não ser
através da medição aqueles a quem Deus falou [...]. De outro modo não podemos
saber se nossos pactos foram ou não aceitos. (p. 107).
- O conteúdo ou objeto de um pacto é sempre
alguma coisa sujeita a deliberação – porque fazer um pacto é sempre um
ato da vontade, quer dizer, o ultimo ato da deliberação –, portanto, sempre se
entende ser alguma coisa futura e que é considerada possível de cumprir por
aquele que firma o pacto. (p. 107).
- Ficam liberados de seus pactos os homens de
duas maneiras; cumprindo ou sendo perdoados. O cumprimento é o fim natural da
obrigação, e o perdão é a restrição da liberdade, constituindo a retransferência
daquele direito em que consistia a obrigação. (p. 107).
- Pactos aceitos por medo, na condição de
simples natureza, são obrigatórios. Por exemplo, se eu me comprometo
pagar um resgate ou um serviço em troca da vida, a meu inimigo, fico vinculado
por esse pacto. Pois, é um contrato, em que um recebe o benefício da vida e o
outro receberá dinheiro ou serviço em troca dela. Obviamente, quando não há
outra lei como é o caso na condição de simples natureza que proíba o
cumprimento, o pacto é válido. (p. 107-108).
- Tudo o que posso fazer legitimamente sem
obrigação posso também compactuar na legalidade por medo. O que eu compactuar
legitimamente não posso romper na legalidade. (p. 108).
- Um pacto em que eu me comprometo a não me
defender na mesma medida é sempre nulo. (p. 108).
- É possível, todavia, fazer um pacto nos seguintes
termos: Se eu não fizer isto ou aquilo mate-me; não se pode fazê-lo nestes
termos: Se eu não fizer isto ou aquilo, não te resistirei quando vieres
matar-me. Decorre que o homem escolhe por natureza o mal menor, que é o
perigo de morte ao resistir, e não o mal maior, que é a morte certa e imediata
se não resistir. (p. 108).
- É igualmente inválido um pacto no sentido de
alguém se acusar a si mesmo, sem garantia de perdão. Na condição de
natureza [...] não há lugar para a acusação, e no Estado civil a acusação é
seguida pelo castigo. (p. 108).
- [...] as acusações arrancadas pela tortura
não devem ser aceitas como testemunho. A tortura é para ser usado, pois, como meio de conjetura, de
esclarecimento num exame posterior e de busca da verdade. O que
nesse caso é confessado contribui para aliviar quem é torturado, não para
informar os torturadores. Não deve ser aceito, portanto, como testemunho
suficiente porque, quer o torturado se liberte graças a uma verdadeira ou a uma
falsa acusação, o fará pelo direito de preservação da vida. (p. 109).
- [...] na condição de simples natureza a
desigualdade do poder só é discernida em caso de eventual luta. (p.
109).
Cap.
15
SOBRE OUTRAS LEIS DE
NATUREZA
A terceira lei de natureza: a justiça –
o que são a justiça e a injustiça – A justiça e propriedade têm início com a
constituição do Estado – A justiça não é contrária à razão – Os pactos não são
anulados pelo vício das pessoas com quem são celebrados – O que é a justiça dos
homens, e justiça das ações – A justiça dos costumes e a justiça das ações – O
que é feito a alguém com o seu próprio consentimento não é injúria – A justiça
comutativa e a distributiva – A quarta lei de natureza: a gratidão – A quinta a
acomodação mútua, ou complacência – A sexta: felicidade em perdoar – A sétima:
que nas vinganças se considere apenas o bem futuro – A oitava, contra a
insolência – A nona, contra o orgulho – A décima, contra a arrogância – A décima
primeira: a equidade – A décima segunda: uso igual das coisas comuns – A décima
terceira: da divisão – A décima quarta: da primogenitura e da primeira posse –
A décima quinta: dos mediadores – A décima sexta: da submissão à arbitragem – A
décima sétima: ninguém pode ser seu próprio juiz - A décima oitava: ninguém
pode ser juiz quando tem alguma causa natural de parcialidade – A décima nona:
do testemunho – Uma regra através da qual é fácil examinar as leis de natureza
– As leis de natureza são sempre obrigatórias em consciência, mas só o são com
efeito quando há segurança – As leis de natureza são eternas, mas são
acessíveis – A ciência destas leis é a verdadeira filosofia moral
- Daquela lei natural em que somos
obrigados a transferir aos outros aqueles direitos que, ao serem conservados,
impedem a paz da humanidade, segue-se uma terceira: os homens têm de cumprir os
pactos que celebrarem. Sem esta lei os pactos seriam vãos e não
passariam de palavras vazias. (p. 111).
- Nesta lei natural assenta a fonte e a
origem da justiça. Sem um pacto anterior, pois, não há transferência de
direito, e todo homem tem direito a todas as coisas, seguindo daí que nenhuma
ação pode ser injusta. Porém, depois de celebrado um pacto, rompê-lo é
injusto. A definição de injustiça é o
não cumprimento do pacto. Tudo o que não é injusto é justo. (p. 111).
- [...] para que as palavras “justo” e
“injusto” possam ter sentido, é necessário alguma espécie de poder coercitivo,
capaz de obrigar igualmente os homens ao cumprimento do pacto, mediante o medo de algum castigo que seja
superior ao benefício que esperam tirar do rompimento do pacto [...]. Não pode haver tal poder antes de
erigir-se um Estado. (p. 111).
- onde não há, portanto, o seu, isto é,
não há propriedade, não pode haver injustiça. Onde não foi estabelecido um poder coercitivo, isto é, onde
não há Estado, não há propriedade, já que todos os homens têm direito a todas
as coisas. (p. 111).
- Onde não há Estado, entende-se, nada
pode ser injusto. (p. 111).
- A natureza da justiça consiste no
cumprimento dos pactos validos, mas a validade dos pactos só começa com
a instituição de um poder civil suficiente para obrigar os homens a cumpri-los,
e é também só ai que começa a haver propriedade. (p. 111).
-
[...] numa situação de guerra, em que os homens são inimigos entre si, na
ausência de um poder comum que os mantenha a todos em respeito, ninguém pode
esperar ser capaz de defender-se da destruição só com sua força e inteligência,
sem o auxilio dos aliados, em aliança das quais cada um espera a mesma defesa.
(p. 113).
- [...] quem quebra seu pacto, e ao mesmo
tempo declara que pode fazê-lo de acordo com a razão, não pode ser aceito por
qualquer sociedade que se constitua em vista da paz e da defesa, a não ser
devido a um erro dos que o aceitam. (p. 113).
-
Alguém que seja deixado fora ou expulso de uma sociedade, portanto, está
condenado a perecer, e se viver nessa sociedade será graças aos erros dos
outros homens, os quais ele não podia prever, e com os quais não podia contar,
portanto, contra a razão de sua preservação. (p. 113).
- [...] a justiça, isto é, o cumprimento
dos pactos, é uma regra da razão, pela qual somos proibidos de fazer todas as
coisas que destroem nossa vida, e, por conseguinte, é uma lei da natureza. (p. 114).
- As
palavras “justo” e “injusto”, quando são atribuídas aos homens, significam uma
coisa, e quando são atribuídas as ações significam outra. Atribuídas ao homem
indicam a conformidade ou a incompatibilidade entre os costumes e a razão.
Atribuídas a ações, indicam a conformidade ou incompatibilidade com a razão,
não dos costumes, mas de determinadas ações. (p. 114).
- Um homem justo é, portanto, aquele que
toma o maior cuidado possível para que todas as suas ações sejam justas. Um
homem injusto é o que despreza esse cuidado. (p. 114).
- A justiça das ações não faz com que aos
homens se achem justos, e sim inocentes. A injustiça das ações também chamada
injúria lhes atribui apenas o nome de culpados. (p. 115).
- A
injustiça de costumes [...] é a aptidão para cometer injuria. (p. 115).
- A
injustiça de uma ação [...] pressupõe que um determinado indivíduo tenha sido
injuriado [...] (p. 115).
-
[...] no Estado: os homens podem perdoar uns aos outros suas dívidas, mas não o
roubo e outras violências que lhes causem danos. Porque não pagar uma dívida é
uma injuria feita a eles mesmos, ao passo que o roubo e a violência são
injurias feitas à instituição do Estado. (p. 115).
-
[...] se quem pratica a ação não tiver anteriormente abandonado seu direito
original de fazer o que lhe aprouve, mediante um pacto antecedente, não há
quebra de pacto, portanto, não há injuria. (p. 115).
- Os autores dividem a justiça das ações
em comutativa e distributiva. Dizem que a primeira consiste numa
proporção aritmética e a segunda num proporção geométrica. Desse maneira, a justiça comutativa é por eles
atribuída à igualdade de valor das coisas que são objeto de contrato. Já a
justiça distributiva à distribuição de benefícios iguais a pessoas de mérito
igual. (p. 115).
- A
justiça comutativa é a justiça de um contratante, ou seja, o cumprimento dos
pactos [...] (p. 116).
- A
justiça distributiva é a justiça de um árbitro, isto é, o ato definir o que é
justo. (p. 116).
-
Assim como a justiça depende de um
pacto antecedente, também a gratidão depende de uma graça antecedente,
quer dizer, de uma dádiva antecedente. É
esta a quarta lei natural, que pode ser assim formulada: “Quem recebeu
benefício de outro, por simples graça, se esforce para que o doador não venha a
ter motivo razoável para arrepender-se de sua boa vontade”. (p. 116).
- [...] a dádiva é voluntária e o objetivo
de todos os atos voluntários é sempre o beneficio de cada um. (p. 116).
- A quinta lei natural é a complacência,
isto é: “Que cada um se esforce por acomodar-se com os outros”. Para
compreender esta lei é preciso levar em conta que na aptidão dos homens para a
sociedade existe certa diversidade de natureza, derivada da diversidade de suas
particularidades. (p. 116).
-
Sendo de esperar que cada homem [...] se esforce o mais que possa por conseguir
o que é necessário à sua conservação, todo aquele que a tal se oponha, por
causa de coisas supérfluas, é culpado da guerra que daí venha a existir. Age,
portanto, contrariamente à lei fundamental e natural que ordena procurar a paz.
Aos
que respeitam esta lei pode chamar-se sociáveis – os latinos chamavam-lhes
commodi. Os que não respeitam se tornam obstinados, insociáveis, refratários e
intratáveis. (p. 117).
- A sexta lei é: “Como garantia do tempo
futuro se perdoem as ofensas passadas, àqueles que se arrependam e o desejam”.
Isso porque o perdão não é mais do que uma garantia de paz [...] (p. 117).
- A sétima lei é: “Na vingança – isto é, a
retribuição do mal com o mal – os homens não dêem importância ao mal passado,
mas só importância ao bem futuro”. O que nos proíbe aplicar castigo com
qualquer intenção que não seja a correção do ofensor ou como exemplo para os
outros. Esta lei é consequência da anterior, que ordena o perdão em vista da
segurança do tempo futuro. (p. 117).
- Causar dano sem razão tende a provocar a
guerra, o que é contrário a lei natural. Geralmente se designa pelo nome de
crueldade. (p. 117).
-
Dado que todos os sinais de ódio ou desprezo tendem a provocar a luta, a ponto
de a maior parte dos homens preferir arriscar a vida a ficar sem vingança, podemos formular em oitavo lugar, com
lei natural, o seguinte preceito: “Ninguém, por atos, palavras, atitude ou
gesto, declare ódio ou desprezo pelo outro”. Ao desrespeito a esta lei
se chama geralmente contumélia. (p. 117-118).
- Decidir quem é o melhor homem é questão
que não tem lugar na natureza, na qual [...] todos os homens são iguais.
A desigualdade atualmente existente foi
introduzida pelas leis civis. Aristóteles, no livro primeiro de sua Política, como fundamento de sua
doutrina, afirma que por natureza alguns homens têm mais capacidade para
mandar, querendo com isso referir-se aos mais sábios – entre os quais se
incluía a si mesmo – devido a sua filosofia. Como se senhor e servo não
tivessem sido criados pelo consentimento dos homens, mas pela diferença de
inteligência, o que não só é contrário à razão, mas é também contrário à
experiência. (p. 118).
- [...]
se a natureza fez os homens iguais essa igualdade deve ser reconhecida. Se a
natureza fez os homens desiguais, como os homens, dado que se consideram
iguais, só em termos igualitários aceitam entrar em condição de paz, essa
igualdade deve ser admitida. Obviamente, como nona lei natural, proponho esta: “Cada homem reconheça os
outros como seus iguais por natureza”. A falta a este preceito chama-se
orgulho. (p. 118).
- Desta lei depende uma outra: “Ao se
iniciar as condições de paz ninguém pretenda reservar para si qualquer direito
que não aceite seja também reservado para qualquer dos outros”. Dessa
forma, é necessário a todos os homens que buscam a paz renunciar a certos
direitos de natureza [...]. (p. 118).
- Se [...], ao fazer a paz, alguém exija para
si aquilo que não aceita seja atribuído aos outros, estará agindo
contrariamente à lei precedente, que ordena o reconhecimento da igualdade dos
homens. Quem respeita essa lei é modesto, e arrogante quem não a respeita. Os
gregos chamavam à violação desta lei de pleonexía, isto é, o desejo de quere
mais do que a sua parte. (p. 118-119).
- Se alguém for confiado servir de juiz entre
dois homens, é um preceito da lei natural que trate ambos equitativamente. Sem
isso, as controvérsias entre os homens só pode ser decididas pela guerra.
Aquele que for parcial num julgamento estará fazendo todo o possível para
afastar os homens do uso de juízes e árbitros [...]. (p. 119).
- Deriva desta uma outra lei: “As coisas
que não poder se divididas, que sejam gozadas em comum, se assim puder ser.
[...]”(p. 119).
- É também uma lei natural: “A todos
aqueles que servem de mediadores para a paz seja concedido salvo-conduto”.
(p. 119).
- Posto que se supõe cada um fazer todas
as coisas tendo em vista seu próprio beneficio, ninguém pode ser um arbitro em
causa própria. (p. 120).
- As leis naturais é que ditam a paz como
meio de conservação das multidões humanas. E são as únicas que dizem respeito à
doutrina da sociedade civil. (p. 120).
- [...] aquele que, possuindo garantia
suficiente de que os outros observarão para com ele as mesmas leis, mesmo assim
não as observar, não procura a paz, mas a guerra, e claramente a destruição de
sua natureza pela violência. (p. 121).
- As leis naturais são imutáveis e eternas.
(p. 121).
- A
ciência dessas leis é a verdadeira e única filosofia moral. Filosofia moral não
é mais do que a ciência do bem e do mal, na conservação e na sociedade humana.
O bem e o mal são nomes que significam nossos apetites e aversões, os quais são
diferentes conforme os diferentes temperamentos, costumes e doutrinas dos
homens. (p. 121).
- A
estas diretrizes da razão se costuma dar o nome de lei, embora impropriamente.
São apenas conclusões ou teoremas relativos ao que contribui para a conservação
e a defesa de cada um. Ao passo que a lei em sentido próprio, é a palavra
daquele que tem direito de mando sobre outro. (p. 122).
Cap. 16
SOBRE AS PESSOAS
AUTORES E COISAS PERSONIFICADAS
O que é uma pessoa – Pessoa natural e
artificial – De onde vem a palavra pessoa – Ator, autor, autoridade – Os pactos
por autoridade obrigam o autor – Mas não o ator – A autoridade deve ser
mostrada – As coisas personificadas inanimadas – Irracionais; falsos deuses;
verdadeiro Deus – Como uma multidão de homens é uma pessoa – Cada um é autor –
Um ator podem ser muitos homens feitos um só por pluralidade de votos – Os
representantes são improfícuos quando em numero par – O voto negativo
- Pessoa é tida como aquela cujas palavras
ou ações são consideradas quer como suas próprias que como representando
palavras ou ações de outro homem, ou de qualquer outra coisa a que
sejam atribuídas [...]. (p. 123).
- Sendo
as palavras a ela atribuída, então, ela se chama uma pessoa natural. Quando
estão representando palavras e ações de um outro, chama-se-lhe uma pessoa
fictícia ou artificial. (p. 123).
- A palavra “pessoa” é de origem latina.
Para lhe dar significado os gregos tinham prósopon,
que significa “rosto”, tal como em latim persona
significa o disfarce ou a aparência exterior de um homem imitado no palco.
Por vezes, mais particularmente aquela parte dela que disfarça o roso, como
mascara ou viseira. Do palco a palavra foi transferida para qualquer
representante da palavra ou da ação, tanto nos tribunais como nos teatros. (p.
123).
- Personificar é representar, seja a si
mesmo ou a outro. Dizem daquele que representa que ele é portador do
personagem ou que age em seu nome [...]. (p. 123).
- As pessoas artificiais emitem palavras e
ações que pertencem àqueles a quem representam. Nesses casos a pessoa é
o ator e aquele a quem pertencem suas palavras e ações é autor. (p. 123).
- Aquele a quem pertencem bens e posses é chamado
proprietário, em latim Dominus, e em
grego Kyrios. (p. 123).
- O direito de posse se chama domínio e o
direito de fazer qualquer ação se chama autoridade. Por autoridade se entende
sempre o direito de praticar qualquer ação. (p. 123).
-
[...] quando o ator faz um pacto por autoridade, obriga através disso o autor,
como se este mesmo ali estivesse [...]. (p. 123).
- Ninguém é obrigado por pacto do qual não
é autor [...]. (p. 124).
-
Quando o ator faz qualquer coisa contra a lei natural por ordem do autor, se
pelo pacto anterior for obrigado a obedecer-lhe, não é ele e sim o autor que
viola a lei natural. (p. 124).
- Uma multidão é transformada em uma
pessoa quando representada por um só homem ou pessoa, de maneira a que tal seja
feito com o consentimento de cada um dos que constituem essa multidão.
(p. 125).
- É a unidade do representante e não a
unidade do representado que faz com que a pessoa seja uma. O representante é o portador da pessoa, e
só de uma pessoa. Esta é a única forma como é possível entender a unidade de
uma multidão. (p. 125).
- A
cada um pertencem todas as ações praticadas pelo representante, caso lhe aja
atribuído autoridade sem limites. De outra forma, quando o limitam quanto à
representação [...] a nenhum deles pertence mais do que aquilo em que deu
comissão para agir. (p. 125).
- Caso
o representante seja constituído por muitos homens, a voz do maior número
deverá ser considerada como a voz de todos eles. (p. 125).
gostei do seu resumo,mas gostaria de saber sua opinião sobre oque você entendeu dos capitulos
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