SOBRE A ORIGEM INTERNA DOS MOVIMENTOS VOLUNTÁRIOS CHAMADOS PAIXÕES E A LINGUAGEM QUE OS EXPRIME
Movimento vital e
animal – o esforço – o apetite – o desejo – a fome – a sede – a aversão – o
amor – o desprezo – o bem – o mal – o pulchrum – o turpe – o delicioso – o
proveitoso – o desagradável – o inaproveitável – o deleite – o desprezo – o
prazer – a ofensa – os prazeres dos sentidos – os prazeres do espírito – a
alegria – a dor – a tristeza – a esperança – o desespero – o medo – a coragem –
a cólera – a confiança – a desconfiança – a indignação – a benevolência – a
bondade natural – a cobiça – a ambição – a pusilanimidade – a magnanimidade – a
valentia – a liberdade – a mesquinhez – a amabilidade – a concupiscência
natural – a luxuria – a paixão – o amor – o ciúme – a vingança – a curiosidade
– a religião – a superstição – a verdadeira religião – o terror pânico – a
admiração – a glorificação – a vangloria – o desalento – o entusiasmo súbito –
o riso – o desalento súbito – o choro – a vergonha – o rubor – a imprudência –
a piedade – a crueldade – a emulação – a inveja – a deliberação – a vontade –
as formas de linguagem na paixão – o bem e o mal aparentes – a felicidade – o
louvor – a exaltação
- Nos animais há dois tipos de
movimentos que lhes são próprios. Um deles chama-se vital: começa com a geração
e continua sem interrupção durante toda a vida. Deste tipo são a circulação do
sangue, o pulso, a respiração, a digestão, a nutrição, a excreção etc. [...] O
outro tipo é o dos movimentos animais também chamados movimentos voluntários,
como andar, falar, mover qualquer dos membros da maneira como anteriormente foi
imaginada pela mente. (p. 45-46)
Os
animais possuem dois tipos de moimentos: o vital e o animal. O primeiro diz
respeito àqueles que são necessários para a existência da vida, como por
exemplo, o movimentos do coração. Já o segundo, diz respeito àquelas coisas que
o indivíduo faz voluntariamente sem se dá conta de o está realizando como, por
exemplo, andar.
- A sensação é o movimento provocado nos
órgãos e partes inferiores do corpo do homem pela ação das coisas que vemos,
ouvimos etc. A imaginação é apenas o resíduo do mesmo movimento, que permanece
depois da sensação [...]. (p. 46).
A
sensação é o movimento que há no corpo humano cuja causa é originária de coisas
que lhes são exteriores. A imaginação é o resto, ou parte final desse movimento
que permanece.
- [...] a imaginação é a primeira origem
interna de todos os movimentos voluntários. (p. 46).
- Embora os homens sem instrução não concebam
que haja movimento quando a coisa movida é invisível ou quando o espaço onde
ela é movida, devido a sua pequenez, é insensível, não obstante esse movimento
existe. (p. 46).
O
movimento existe tanto nas coisas visíveis como nas invisíveis; tanto nas coisas
sensíveis como nas insensíveis.
- Estes pequenos inícios do movimento,
no interior do corpo do homem, [...] chamam-se esforço [...]. Quando vai em
direção de algo que o causa, esse esforço chama-se apetite ou desejo. [...]
quando o esforço vai no sentido de evitar alguma coisa chama-se geralmente
aversão. (p. 46)
Apetite
e desejo são dois desdobramentos do esforço do corpo que se movimenta. O desejo
neste sentido faz referência ao alimento. Apetite e desejo caminham opostamente
à aversão.
- Apetite e aversão são palavras que vem
do latim, e ambas designam movimentos, uma de aproximação e outra de
afastamento. (p. 46)
- Daquilo que os homens desejam se diz
também que o amam e que odeiam aquelas coisas pelas quais sentem aversão. De
modo que desejo e amor são a mesma coisa, salvo que por desejo sempre se quer
significar a ausência do objeto e quando se fala em amor geralmente se quer
indicar a presença. Também por aversão se quer designar a ausência e quando se
fala de ódio pretende-se indicar a presença. (p. 46-47)
O
desejo é sempre desejo daquilo que ainda é ausente, ao passo que o amor é
sempre a presença de algo que já está dado. Da mesma forma a aversão é a
ausência daquilo a que se odeia quando está próximo.
- [...]
das coisas que inteiramente desconhecemos, ou em cuja existência não
acreditamos, não podemos ter outro desejo que não o de provar e tentar.(p.
47)
-
Daquilo que não desejamos nem odiamos se diz que desprezamos.
(p. 47)
- Como a constituição do corpo de um homem se
encontra em constante modificação, é impossível que as mesmas coisas nele
provoquem sempre os mesmos apetites e aversões e muito menos é possível que os
homens coincidam no desejo de um só e mesmo alvo. (p. 47).
Devido
às transformações constantes a que passa o homem, se torna impossível que ele
seja afetado frequentemente por uma única coisa e no mesmo lugar.
- seja qual for o objeto do apetite ou desejo
de qualquer homem, esse objeto é aquele a que cada um chama bom; ao objeto de
seu ódio e aversão chama mau, e ao de seu desprezo chama vil e indigno. (p.
47).
- [...] nem há qualquer regra comum do
bem e do mal que possa ser extraída da natureza dos próprios objetos. Ela só
pode ser tirada da pessoa de cada um, quando não há Estado, ou então, num
Estado, da pessoa que representa cada um [...]. (p.
47).
Com
isso, Hobbes evidencia que tanto o mal quanto o bem não são características dos
objetos, mas dos seres, especificamente o homem.
- Aquilo que realmente está dentro de
nós é apenas movimento, tal como na sensação, provocado pela ação dos objetos
externos [...]. (p. 48).
- Chama-se esperança o apetite ligado à
crença de conseguir. Sem essa crença, o apetite chama-se desespero. [...]
Chama-se confiança em si mesmo a esperança constante. Chama-se desconfiança em
si mesmo o desespero constante. [...] Chama-se benevolência, boa vontade,
caridade o desejo do bem dos outros. [...] Chama-se cobiça o desejo do bem dos
outros [...]. Chama-se pusilanimidade o desejo de coisas que só contribuem um
pouco para nossos fins e o medo das coisas que constituem apenas um pequeno
impedimento. (p. 49).
- Chama-se concupiscência natural o amor
pelas pessoas apenas sob o aspecto dos prazeres dos sentidos. (p. 50).
- O porquê, o como e o desejo de saber
chamam-se curiosidade, e não existe em qualquer criatura viva a não ser no homem.
Dessa forma, não é só por sua razão que os homens se distinguem dos outros
animais, mas também por sua singular paixão. Nos outros animais o apetite pelo
alimento e outros prazeres dos sentidos predominam de tal modo que impedem toda
preocupação com o conhecimento das causas, o qual é um desejo do espírito que,
[...] supera a fugaz veemência de qualquer prazer carnal. (p.
50)
Aqui
Hobbes assinala para algumas das características que vão permitir diferenciar
os homens dos animais, como, por exemplo, a própria curiosidade em saber das
coisas, o que, evidentemente, é exclusividade dos homens. Outro elemento importante – nos animais – é o
apetite, a partir do qual se dá a impossibilidade do conhecimento das causas da
coisa.
- Causado pelos poderes invisíveis,
inventados pelo espírito ou imaginados a partir de relatos publicamente
permitidos, chama-se religião o medo daí advindo; quando esses não são
permitidos chama-se superstição. Quando o poder imaginado é realmente como o
imaginamos, chama-se verdadeira religião. (p. 50)
Nesta perspectiva, a religião aparece como
desdobramento do medo que os homens têm dos espíritos. É como se a religião
fosse uma forma de dizer para os espíritos que a eles será dado respeito.
- Chama-se admiração a alegria ao saber
de uma novidade; é própria do homem porque desperta o apetite de conhecer a
coisa. (p. 50).
- Chama-se vangloria a invenção ou suposição
de capacidades que se sabe não possuir [...]. (p. 51).
- [...] um excesso de riso perante os defeitos
dos outros é sinal de pusilanimidade. Porque o que é próprio dos grandes
espíritos é ajudar os outros a evitar o escárnio e comparar-se apenas com os
mais capazes. (p. 51).
Os
grandes espíritos não se constituem a partir de coisas pequenas mediante as
quais prejudicam os outros, mas a partir das ações pelas quais se busca ajudar
diretamente aqueles que precisam ser ajudados.
- É a vergonha a tristeza devida à
descoberta de alguma falta de capacidade, a paixão que se revela através do
rubor. (p. 51)
- Chama-se imprudência o desprezo pela
boa reputação. (p. 52)
- Chama-se piedade a tristeza perante a
desgraça alheia, e surge do imaginar que a mesma desgraça poderia acontecer a
nós mesmo. (p. 52)
Ter
piedade dos outros significa reconhecer em nós mesmo às possibilidades de realização
das desgraças pela qual nos sensibilizamos frente ao outro.
- Chama-se crueldade o desprezo ou pouca
preocupação com a desgraça alheia, que deriva da segurança da própria fortuna.
Pois considero inconcebível que alguém possa tirar prazer dos grandes prejuízos
alheios, sem que tenha um interesse pessoal no caso. (p. 52)
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