quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

FICHAMENTO DO CAP. V DO LEVIATÃ


SOBRE A RAZÃO E A CIÊNCIA

O que é a razão – Definição de razão – Onde está a reta razão – O uso da razão – Do erro e do absurdo – Causas do absurdo – Ciência – Prudência e sapiência, e diferença entre ambas – sinais da ciência

- Raciocinando alguém, nada mais faz do que conceber uma soma total, a partir da adição de parcelas, ou conceber um resto a partir da subtração de uma soma por outra [...]. (p. 39).
Aqui já se percebe que como, em Hobbes, a razão se liga ao calculo, tal como na matemática, por exemplo.
- Os escritores de política adicionam em conjunto pactos para descobrir os deveres dos homens. Os juristas somam leis fatos para descobrir o que é certo e é errado nas ações dos homens privados. [...] seja em que matéria for que houver lugar para a adição e para subtração, há também lugar para a razão. Onde aqueles não tiverem o seu lugar, também a razão nada tem a fazer. (p. 39).
Hobbes assinala, portanto, que razão e calculo caminham juntos mantendo, por conseguintes uma relação inseparável.
- Razão [...] nada mais é do que cálculo, isto é, adição e subtração das conseqüências de nomes gerais estabelecidos para marcar e significar nossos pensamentos. [...] marcar quando calculamos para nós próprios, e significar quando demonstramos ou aprovamos nossos cálculos para os outros homens. (p. 39).
 Aqui Hobbes demonstra bem claramente o sue conceito de razão, algo que anteriormente ele já vinha demonstrando indiretamente. Para ele, a razão é calculadora, dado que tem a função de calcular seja por meio das palavras, tal como se pode ver na lógica, ou por meio de números, como se pode observar na matemática. Quando esse cálculo é para o próprio sujeito que calcula, diz-se que a razão marca. Quando, porém, esse cálculo visa demonstrar ou provar os o que se calculou para outra pessoa, diz-se que ele serve para significar. (p. 39).
- [...] quando há controvérsia a propósito de um cálculo as partes têm de, por acordo mútuo, recorre a uma razão certa, à razão de algum arbitro, ou juiz, a cuja sentença se submetem, a menos que sua controvérsia se desfaça  e permaneça indecisa por falta de uma razão certa constituída  pela natureza. (p. 40).
Neste ponto, Hobbes já chama a atenção para a figura do rei soberano, que é tido como referência para a resolução de problemas que os indivíduos por si mesmos não conseguem chegar a um consenso. A esse soberano todos os súditos se submetem enquanto houver divergência entre eles. Como juiz constituído pela vontade de todos, a última palavra é dada, então pelo rei.
- O uso e finalidade da razão não é descobrir a soma e a verdade de uma, ou várias conseqüências, afastadas das primeiras definições, e das estabelecidas significações de nomes, mas começar por estas e seguir de uma conseqüência para outra. (p. 40).
A razão deve tomar como ponto de partida, portanto, a definição e a significação dos nomes.
- [...] o erro é apenas uma ilusão, ao presumir que algo aconteceu, ou está para acontecer, acerca do que, muito embora não tivesse acontecido, não existe, contudo, nenhuma impossibilidade aparente. (p. 41).
O erro significa, portanto, uma não correspondência à determinadas expectativas.
- Os homens todos, por natureza, raciocinam de forma semelhante, e bem, quando têm bons princípios. (p. 43).
Ter bons princípios é o que faz com que haja semelhança de raciocínio entre os homens.
- [...] a razão não nasce conosco como a sensação e a memória, nem é adquirida apenas pela experiência, como a prudência, mas obtida com esforço, primeiro por meio de uma adequada imposição de nomes, e em segundo lugar por intermédio de um método bom e ordenado de passar dos elementos, que são nomes, a asserções feitas por conexão de um deles com o outro, e daí para os silogismos, que são as conexões de uma asserção com outra, até chegar ao conhecimento de todas as conseqüências de nomes referentes ao assunto em questão. A isso os homens chamam ciência. [...] a ciência é o conhecimento das conseqüências [...]. (p. 43).
A razão, em Hobbes, não se trata de algo inato, mas algo que se adquire a partir das experiências que o indivíduo vai realizando no seu processo de desenvolvimento enquanto ser vivo. Um bom método para o alcance da razão se torna algo indispensável. O ponto de partida ruma a esse empreendimento é constituído pela imposição de nomes que o individuo deve colocar nas coisas marcando assim a sua definição, bem como o seu significado. O objetivo de tudo isso é a aquisição do conhecimento, ou ciência das coisas.
- [...] as crianças não são dotadas de razão nenhuma até que atinjam o uso da linguagem, mas são denominadas seres racionais devido a aparente possibilidade de terem o uso da razão na sua devida altura. (p. 43).
Hobbes postula que o que torna possível o alcance da razão é a linguagem. Somente por meio desta é que homem pode alcançar aquela.
- [...] a luz dos espíritos humanos são as palavras claras, meridianas, mas primeiramente limpas por meio de exatas definições e purgadas de toda ambigüidade. A razão é o passo, o aumento da ciência o caminho, e o beneficio da humanidade é o fim. De outro lado, as metáforas e as palavras ambíguas e destituídas de sentido são como ignes fatui, e raciocinar com elas é o mesmo que perambular entre inúmeros absurdos. (p. 44).
Percebe-se a insistência de Hobbes em defender que o ponto de partida rumo a aquisição do conhecimento verdadeiro, consiste na previa definição das palavras. É justamente essa clareza de definição que guia o espírito humano na busca pela ciência. A razão e a ciência são coisas diferentes, entretanto, é por meio de uma que se chega ao alcance da outras. O percurso é este: por meio da linguagem se chega à razão e por meio dessa, que consiste no estabelecimento de definições e significações precisas para as palavras, é que se chega ao alcance da ciência.
- Uns certos e infalíveis, outros incertos, assim são os sinais da ciência. Certos quando aquele que aspira à ciência de alguma coisa sabe ensinar a matéria, isto é, demonstrar sua verdade de maneira perspícua a alguém. Incertos quando apenas alguns eventos particulares correspondem à sua pretensão e em muitas ocasiões se revelam da maneira que ele diz que deviam acontecer. (p. 44).
Há, portanto, dois sinais da ciência: os falíveis e os infalíveis. Os primeiros consistem na demonstração correta daquilo a que se pretende ensinar. Os segundos são aqueles que se realizam apenas parcialmente, isto é, em certos aspectos.




quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

FICHAMENTO COMENTADO DO CAP. IV DO LEVIATÃ




SOBRE A LINGUAGEM 

Origem da linguagem – O uso da linguagem – Abusos da linguagem – Nomes próprios e comuns – Universais – Necessidades das definições – Objeto dos nomes – Uso dos nomes positivos – Nomes negativos e seus usos – Palavras insignificantes – Entendimento – Nomes inconstantes

- Ignora-se quem descobriu o uso das letras. Diz-se que o primeiro que as trouxe para a Grécia foi Cadmus, filho de Agenor, rei da Fenícia. Invenção fecunda para prolongar a memória dos tempos passados e estabelecer a conjunção da humanidade dispersa por tantas e tão diferentes regiões da terra. (P. 31).
Hobbes chama a atenção para o fato de que não há nenhuma certeza quanto a descoberta das letras. Entretanto, assinala que uma das funções primordiais da escrita é registrar o passado, e prolongá-lo na memória.
- Mas a mais nobre e útil de todas as invenções foi a da linguagem, que consiste em nomes ou apelações e em suas conexões, pelas quais os homens registram seus pensamentos, os recordam posteriormente e também os usam entre si para fins uteis e conversas recíprocas, sem o que não haveria entre os homens Estado, sociedade, contrato, paz, tal como não existem entre os leões, os ursos e os lobos. (P. 31).
A linguagem é, portanto, no pensamento de Hobbes o meio pelo qual tudo se torna possível. Ela consiste na conexão que se estabelece entre os nomes.
- Toda esta linguagem adquirida e aumentada por Adão e sua posteridade, foi novamente perdida na torre de Babel, quando pela mão de Deus, todos os homens foram punidos, devido a sua rebelião, pelo esquecimento de sua primitiva linguagem. Sendo, depois disso, forçados a dispersar-se pelas varias partes do mundo, resultou necessariamente que a diversidade de línguas hoje existentes proveio gradualmente dessa separação [...].  (P. 31-32). 
Hobbes parte do princípio de que Deus é o criador da linguagem e a ensinou a Adão. Entretanto, pela desobediência a Deus os homens esqueceram sua linguagem primeira, como forma de castigo. Ou seja, o evento de Babel, marca a origens das diversas línguas.
- Passar nosso discurso mental para um discurso verbal, ou cadeia de nossos pensamentos para uma cadeia de palavras, caracteriza o uso da linguagem. [...] a primeira utilização dos nomes consiste em servir de marcas ou notas de lembranças. (P. 32).
A linguagem consiste, portanto, na transposição do pensamento para a palavra. Como tal, a linguagem também cumpre com a função de resgatar pensamentos que por alguma razão tenha escapado da memória.
- Os usos especiais da linguagem são os seguintes: primeiramente, registrar aquilo que descobrimos ser a causa de qualquer coisa, presente ou passada, e aquilo que achamos que as coisas presentes ou passadas podem produzir ou causar, o que em suma é adquirir artes. A seguir, para mostrar aos outros aquele conhecimento que atingimos, ou seja, aconselhar e ensinar uns aos outros. Em terceiro lugar, para dar a conhecer aos outros nossas vontades e objetivos, a fim de podermos obter ajuda. Em quarto lugar, para agradar e para nos deliciar, e aos outros, jogando com as palavras, por prazer e ornamento, de maneira inocente. (p. 32).
Hobbes concebe, portanto, quatro usos específicos da linguagem. Sinteticamente pode-se dizer que esses usos consistem em registrar, mostrar, demonstrar e agradar.
- Quatro abusos correspondem a esse uso. Primeiro, quando os homens registram erradamente seus pensamentos pela inconstância da significação de suas palavras, com as quais registram como, suas concepções aquilo que nunca conceberam e, desse modo, se enganam. Em segundo lugar, quando usam palavras de maneira metafórica, ou seja, com sentido diferente daquele que foi atribuído às palavras. Em terceiro lugar, quando por palavras declaram ser sua vontade aquilo que não é. Em quarto lugar, quando as usam para se ofender uns aos outros, dado que a natureza armou os seres vivos uns com dentes, outros com chifres, e outros com mãos para atacar o inimigo, nada mais é do que um abuso da linguagem ofendê-lo com a língua, amenos que se trate de alguém que somos obrigados a governar, mas não é ofender, e, sim, corrigir e punir. (p. 32-33).
Os quatros usos da linguagem degeneram em quatro abusos. Esses abusos resultam de erros devido a usos inconvenientes da linguagem.
- A linguagem é útil para a recordação das conseqüências de causas e efeitos, por meio da imposição de nomes e da conexão destes. (P. 33).
A recordação das coisas se dá por meio dos nomes que anteriormente são conferidos a essas mesmas coisas. É nesse sentido que a linguagem serve para recordar.
- Um nome universal é atribuído a muitas coisas, devido a sua semelhança em alguma qualidade ou outro acidente. Enquanto o nome próprio traz ao espírito uma coisa apenas, os universais recordam qualquer dessa muitas coisas. (p. 33).
Com os nomes universais ouve uma diminuição dos esforços humanos para entender as coisas. Essa redução do esforço para se entender, no que a isso diz respeito, deve-se primordialmente à sintetização, ou redução das coisas complexas, que passaram a ser simples, em certos aspectos.
- [...] o uso de palavras para registrar nossos pensamentos não é tão evidente como na numeração. Um louco de nascença que nunca conseguisse aprender de cor a ordem das palavras numerais, como um, dói, três, pode observar cada uma das pancadas de um relógio e acompanhar com a cabeça, ou dizer um, um, um, mas nunca pode saber que horas são. (p. 34).
Por meio do número, o registro de palavras se torna algo universal a todos os seres humanos, inclusive aos loucos.
- [...] sem palavras não há qualquer possibilidade de reconhecer os números e muito menos as grandezas, a velocidade, a força e outras coisas, cujo calculo é necessário á existência ou ao bem-estar da humanidade. (p. 34).
A palavra, ou linguagem, é, portanto, o meio indispensável para o conhecimento de tudo o que existe.
- O verdadeiro e o falso são atributos da linguagem e não das coisas. Onde não houver linguagem, não há nem verdade nem falsidade. (p. 34-35).
É a linguagem, portanto, que diz o que as coisas são. Tudo o que é, só o é porque a linguagem assim o concebeu.
- [...] a verdade consiste na adequada ordenação de nomes em nossas afirmações. (P. 35).
- [...] em geometria, [...] os homens começam estabelecendo as significações de suas palavras. A esse estabelecimento de significações chamam definições, e colocam-nas no início de seu cálculo. [...] é necessário a qualquer pessoa que aspire a um conhecimento verdadeiro examinar as definições dos primeiros autores [...]. (p. 35).
As palavras se definem, portanto, a partir daquilo que elas anteriormente significam. Ou seja, o significado determina a definição.
- [...] na correta definição de nomes reside o primeiro uso da linguagem, o qual consiste na aquisição de ciência; e na incorreta definição, ou na ausência de definições, reside o primeiro abuso, do qual resultam todas as doutrinas falsas e destituídas de sentido [...]. (P. 35).
Ou seja, a aquisição da ciência, enquanto conhecimento consiste na definição dos nomes que devem ser usados. Os erros, ou abusos resultam da falta de significações.
- Entre a verdadeira ciência e as doutrinas errôneas situa-se a ignorância. (p. 35).
Essa ignorância que transita entre a ciência e o erro resulta justamente do erro decorrentes do inconveniente uso das palavras, sobretudo, quando essas não possuem significados claros.
- A natureza em si não pode errar; e à medida que os homens adquirem abundancia de linguagem, vão-se tornando mais sábios ou mais loucos do que habitualmente. Nem é possível sem letras que um homem se torne extraordinariamente sábio, ou extraordinariamente louco, a menos que sua memória seja atacada por doença ou tenha deficiência na constituição dos órgãos.  (p. 35-36).
Como tal a linguagem é fonte de conhecimento. Sendo conhecimento ela também é definidora do homem.
- As palavras são os calculadores dos sábios que só com elas calculam. (p. 36).
- Os latinos chamavam aos cômputos de moeda ratione, e ao cálculo ratiocinatio [...] parece daí resultar a extensão da palavra ratio a faculdade de contar em todas as outras coisas. Os gregos têm uma só palavra, logos, para linguagem e razão. Não que eles pensassem que não havia linguagem sem razão, mas, sim, que não havia raciocínio sem linguagem. (P. 36).
A linguagem é necessária para que haja raciocínio, pois é por meio dela que o pensamento se expressa.
- Sempre que qualquer afirmação seja falsa, os dois nomes pelos quais é composta, postos lado a lado e tornado num só, não significam absolutamente nada. Por exemplo, se for uma afirmação falsa dizer “um quadrângulo é redondo”, a expressão quadrângulo redondo nada significa e é um simples som. (p. 37). 
A verdade de uma sentença resulta do correto uso das palavras. Caso esse uso seja equivocado, a frase que as palavras forma é vazia de sentido.
- [...] se a linguagem é peculiar ao homem [...], o entendimento lhe é peculiar. (p. 38).
- [...] os nomes são impostos para significar nossas concepções [...], nossas afeições nada mais são do que concepções, quando concebemos as mesmas coisas de forma diferente [...]. (p.38).
Os nomes, portanto, sevem para representar os conceitos que estabelecemos acerca das coisas.

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